Não há mal que não venha por bem
Há, no entanto, um exercício interessante de se fazer quando estamos perante bombos da festa: imagina-te no lugar dos seus filhos, dos seus pais, dos seus amigos, da sua namorada/companheira/mulher. Se estivesses nos seus lugares que tipo de conforto sentirias com escritos tão, profundamente, literários? Imagino que desse lado há quem pense: olha, olha, e achas que esses políticos perdem oportunidades para nos/te vilipendiar?
Sim, compreendo que tal argumento tem pouca validade, afinal se todos pensássemos assim há jornais/canais de televisão que pura e simplesmente se eclipsariam e jornalismo de investigação cujo conteúdo se resumiria a pouco.
Não me parece, no entanto, que estejamos a tomar consciência de questões importantes:
- de que forma o descrédito da política afecta a democracia?
- de que forma a manipulação jornalística, em prole de vendas/audiências, afecta a forma como observamos o mundo em que vivemos?
- de que forma a superficialidade, a generalização apoiada apenas numa experiência de senso comum, afecta a nossa vivência em sociedade?
Estes políticos são apenas um exemplo objectivo e figurativo de casos de indignidade e leviandade a todos os níveis. Não me interessam, minimamente, os ajustes de contas, as injustiças sofridas, as razões de queixas. Os jornais estão repletos de informações bombásticas sobre políticos da praça cuja investigação criminal tem milhares de páginas e cujo resultado é uma notícia de telejornal de alguns segundos, quando é. Esta forma de pressão do jornalismo sobre a investigação, tribunais, tem conduzido ao descrédito do funcionamento das instituições públicas. Compreendo que há interesses em determinados sectores na descredibilidade de certas instituições. Há, por exemplo, interesses privados na descredibilização da escola pública, há, por exemplo, interesses privados na descredibilização da saúde pública. Quanto maior for o desinvestimento dos estados nessas áreas, mais oportunidades de negócios globais elas proporcionam. O papel dos jornais, dos canais de televisão, não deve ser, por isso, exercido sem pensar nestas questões.
Quando surgem crónicas, notícias do género, lembro-me sempre da minha aldeia, onde toda a gente conhece os "podres" de toda a gente e onde um, de vez em quando, é o bombo da festa.
Oh, mas afinal para quê exagerar? Trata-se apenas de um exercício de catarse pública, traduzido no proverbial "não há mal que não venha por bem".
Agenda da semana:
Ir a correr ao clube de vídeo e rever o último filme de Robert Redford, Lions for Lambs, Meryl Streep num papel inesquecível. Um exercício excelente sobre a nossa responsabilidade na sociedade.