sábado, junho 30, 2007

Todos os caminhos

Alentejo - Portugal
Fotografia:
Pedro Gilberto

Findo Junho, mês em que procurámos percorrer alguns dos caminhos de Portugal, fica sempre aquela sensação de pesar por não nos termos referido à beleza daquele local em particular. Da minha parte, é quase um acto de sacrilégio terminar este mês sem me ter referido às lindíssimas vilas de Sintra, Óbidos ou Reguengos de Monsaraz [que o Carlos Malmoro teve a bem-aventurada ideia de referenciar no seu périplo]. Também lamento a falta de referência adequada às ilhas açorianas, particularmente à de São Miguel e à beleza natural da Lagoa das Sete Cidades. E por falar em lagoas, embora numa dimensão bastante mais reduzida, também me faltou uma alusão condigna à magia que emana da Lagoa Azul, no eixo Sintra-Cascais.

Podemos até não ter muito orgulho do nosso país [falo por mim] mas, apesar de tudo e até ver, se há algo de que nos podemos ainda envaidecer é da beleza única de alguns dos seus lugares.

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sexta-feira, junho 29, 2007

O eco da palavra





















Foto: Chema Madoz

O poema não funciona é o que dizes
por vezes sobre versos que te mando
funcionará depois? As cicatrizes
das modificações somem-se quando

alguns dias mais tarde o reescrito
texto releio tudo funcionando
no seu exacto corpo como o dito
som da palavra ecoando

em casa como em gruta, grito
logo perdido nos confins da pedra
certo batendo e desfazendo o hirto
silêncio de granito em que penetra

Era a alma do poema que faltava,
o eco da palavra?

Gastão Cruz; "O eco da palavra", O som do mundo, in Repercussão, Assírio & Alvim, Lisboa, 2004, pág 28

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(Des)concertos

Na província temos a melhor banda do planeta em iPod, o que já não é nada mau.
Mas também não iria ao estádio (foi num estádio, não?), faz-me um bocado de confusão tanta gente junta.
[Mentalidade de provinciana]
A única vez que fui a um estádio, para além de não conseguir ver o Prince, estive ali meio esborrachada, desconchavada, espalmada, para além de descontrolada e ensurdecida.
Concertos sim, mas sentadinha e com muito pouca pachorra para encontrões e pós e essas sensações levemente desenfreadas.
Também já experimentei o Pavilhão Atlântico e também não gostei. É certo, fui ver o mágico americano (de repente ocorreu-me uma branca) e fiquei assombrada. Como é possível conceber coisa tão magnificamente pirosa?
[Por falar em piroso, já alguém viu o American Dreamz?]
Não gosto de banhos de multidão!
O último que apanhei foi no último dia da Expo, apesar de ter gostado da experiência regeneradora - o fim, foi o fim! - não voltarei a magicar ideia tão brilhante nas próximas décadas.
Certo, concordo! Sou uma provinciana ligeiramente claustrofóbica e, porventura, comodista.
Mas, desculpem lá, o dinheirinho sai da minha bolsa.
Portanto, nada de concertos em estádios.
De preferência o Teatro Académico Gil Vicente, o Coliseu dos Recreios, o São João, algures entre o desconforto de uma cadeira pudica e a concentração digna de um (des)gosto.

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quinta-feira, junho 28, 2007

Breaking News

Falta cerca de uma hora para a maior e melhor banda do planeta subir ao palco do Parque Tejo.

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Cidade Oculta

Maldigo a espaços a natureza noctívaga que me impele a não aproveitar a plenitude das manhãs luminosas. Era pois uma manhã de sol aquela em que inesperadamente me (re)encontrei na cidade que albergou e nutriu o amor do meu pai e de minha mãe, os viu crescer juntos e assistiu também numa manhã de sol à união indissolúvel que perdurou até a um dia de Setembro. Nesta manhã a luz beijava a cidade, o céu azul como cenário para a Sé, as ruelas estreitas e o granito, sempre presente, definitivo e resistente, frio e imenso. D. Duarte bem no meio da praça a que empresta o nome e as gentes acordando com a cidade, um bom dia aqui e ali tão genuíno com a luz matinal, o bulício miudinho com a lentidão de um corpo que se espreguiça com a alvorada do espírito, as portas das lojas abrindo como pestanas e gente daqui para ali com algo para entregar, pão, jornais, encomendas, e a luz entre as ruas estreitas daquela parte da urbe, as casas estreitas unidas como abraços, e eu e o meu pai redescobrindo a cidade, a sua cidade, e ele sussurrando-me vês, vês como é bonito o granito, vês, como é linda a Sé, olha aqui e eu, sem ele e com ele, a tudo ver, sim, Papá, que linda está a cidade, que bonito o granito sim, e olha Papá, olha ali e ele sempre a meu lado, rematando, eu bem te disse, filha. Afinal quem é que tinha razão? Deixando-me sem resposta, apenas com as palavras engasgadas na garganta eras tu, Papá e ambos continuámos pela cidade, eu e ele, eu revendo tudo e ele reafirmando como sempre as suas certezas e feliz como sempre em partilhar o que lhe era querido como sempre fez também. Sem ele agora. As cidades ocultas revelam a sua perfeição em diálogos inaudíveis.


Viseu
foto: minha

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Os 7 horrores de Portugal

Li hoje no Público online, foi lançada mais uma votação, desta vez sobre os sete horrores de Portugal. Segundo o diário nortenho, a mesma visa promover uma discussão sobre a arquitectura em Portugal.
O pessoal pisca o olho ao articulista e diz: sim senhor, é isso mesmo! e nem sequer gesticula temperamentalmente contra a maioria das designações.
As dúvidas, sobre as escolhas, decimaram-se logo após o esclarecedor: por vezes, uma das obras citadas, pode ser só nomeação de um dos "especialistas".
Vamos lá ficcionar sobre a forma como decorreu tal definidíssima promoção?
O chefe de redacção chama o estagiário, de serviço, e diz:
Ó pá vai ter com estas pessoas - entrega uma lista - e pede-lhes para referirem meia dúzia de horrores arquitectónicos portugueses.
Vai daí o estagiário dirige-se aos especialistas de arquitectura, um deles, adepto simpático do Benfica, nomeia o novo estádio do Sporting; outro, simpatizante de Siza, desadora Tomás Taveira, o anti-religioso, baptiza o Santuário de Fátima; e o "antipatizante" da incontinência orçamental, elege a Ponte Europa.
Ah, meus caros, mas a votação tem, obviamente, como pressuposto, uma reflexão aprofundada e um debate acérrimo sobre a arquitectura em Portugal.
O escriba deste post, conhecedor profundo da arquitectura em Portugal, concorda com a nomeação do edifício Arnado, em Coimbra, o arquitecto que consumiu neurónios com tal obra de arte, poderia saber muito sobre engenharia, mas pouco sobre estética arquitectónica.
Mas não me conformo mesmo é com a nomeação da Ponte Europa. (Que dirão os nossos colegas sobre isto?).

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quarta-feira, junho 27, 2007

Flexisegurança à portuguesa

Imagem via: NoNaMe

Até ontem era flexibilidade com segurança. Mas como afinal o modelo sai muito caro, importamos a flexibilidade, borrifamo-nos na segurança, e criamos o nosso próprio modelo: a flexisemgurança.

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O direito à preguiça

Quarteira é o meu refúgio de férias. Apesar do imenso mar de gente em Agosto, há em Quarteira, para mim, uma magia especial.
O calçadão, a feira nocturna de artesanato/livro, o delicioso parque infantil, as peixeiras da praça, o peixe fresco, a praça da fruta, caríssima, mas imodesta; a irreverência social de Vilamoura, dos brasileiros, dos luso-africanos, dos turistas, dos regionalismos; o cheiro intenso a mar, as tascas, os restaurantes, o marisco, a padaria, as esplanadas e os nadadores salvadores don juans.
A sujidade das ruas, as damas e os cãezinhos; os preços convidativos do supermercado, do peixe, da fruta; as ruas apinhadas de carros, pessoas, criaturas, figuras e mais transeuntes; e, fundamentalmente, a míngua, insuficiência, escassez e, quiçá, penúria, de areal.
A praia, para mim, é sinónimo de preguiça, indolência, vadiagem e sornice.
Se, por acaso, encontrarem uma preguiceira num qualquer areal, sou eu, e tenham, sobretudo, em atenção, que não são bem-vindos discursos louvando o empenho, a competência e os benefícios da interacção.
Quando um corpo se conforma a um areal, um intelecto vagueia rumo a um desconhecido, o sol inunda uns poros de relaxamento, não há nenhum motivo político ou social que impeçam um certo mirar de faz de conta, um cuidar apaziguador, um vigiar aceso, outro de benevolência, e, aqui e acolá, um contentamento à laia de serviço social; depois, e também, um vaguear ondeante pela impertinência intelectual de certas pernas, físicos ou importunidades matizadas; não sem um quê de consciencialização da irreverência teórica do estudo dos outros.
Enfim, acima de tudo, não peço desculpa, pois, eu e o meu direito à preguiça, são bens inegociáveis.

Nota: as fotos são da responsabilidade de uma senhora muito temperamental, chamada Sony Cyber-shot, é vulgar ouvi-la louvar as suas Carl Zeiss, os efectivos 4,1 mega pixeles, o 3x optical zoom.
Costumo segredar-lhe ao ouvido; uma espécie de chamada a terra, necessária a quem não sente que o sucesso lhe subiu à cabeça; caríssima a Nikon recente observa a realidade com uma outra reverência: 8/9 pixeles, ou qualquer coisa do género, já lhe perdi a conta.
A folgazona encolhe os ombros e murmura:
- e, por acaso, já reparaste na deselegância do seu estojo?
Caríssimos, quando se convive de perto, com maus feitios, temos de encolher os ombros e seguir em frente, é que, acima de tudo, nos tempos que correm, não abunda a pachorra.

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terça-feira, junho 26, 2007

Tríptico

Quem passa por Alcobaça, não passa sem lá voltar, diz o adágio, que, como é proverbial nestas coisas, também se engana. Já passei por lá, nunca lá voltei. Nada contra, aliás o tempo contra. A cidade é dominada pelo portentoso Mosteiro de Santa Maria. Se se costuma dizer que os romancistas só devem escrever sobre o Amor e a Morte, por serem essas as duas únicas questões importantes da Humanidade, então deve escrever-se sobre um mosteiro onde estão sepultados Pedro e Inês. Além disso, a imponência meticulosa da arquitectura pode sempre dar uma ajuda às descrições.


Gosto de Tomar. Uma cidade feita ao longo do Rio Nabão, parece uma aldeia grande, não existissem tantos e tão variados monumentos, desde conventos a ermidas, e de aquedutos a sinagogas. Dizer que Tomar é a cidade do Convento de Cristo é redutor, muito redutor. Há um encanto qualquer daquela pequena cidade que sobreviveria, imaginemos, ao desaparecimento do Convento. Aliás, ele está altaneiro em relação à cidade e, portanto, não acrescenta nada ao fascínio do centro dela. Contudo, o Convento de Cristo é talvez a única coisa em que eu e a Ministra estamos de acordo: se votasse nas Sete Maravilhas, o meu primeiro voto iria para ele.




Eu não sei se foi a aldeia da Batalha que deu o nome ao Mosteiro ou o contrário. Segundo reza a História, foi erigida como cumprimento de uma promessa de D. João I por ter vencido a Batalha de Aljubarrota. Contou com a ajuda, como se sabe, da Virgem que acudiu ao pedido, do célebre método do «Quadrado» e de uma improvável padeira. Mas o mais improvável é que o local do Mosteiro onde se atinge o expoente máximo da perfeição dê pelo nome de Capelas Imperfeitas.


Para fechar este tríptico com um pouco de anarquia, nada melhor que falar sobre mais dois sítios. Em noventa por cento dos casos, a primeira viagem às «Portas do Sol» em Santarém, decorre na visita de estudo do 10.º ano para melhor enquadrar as «Viagens na Minha Terra» de Garrett. Assim como Joaninha e um homónimo descobrem o amor por essas bandas, assim nós descobrimos a infinidade da lezíria ribatejana. Outra terra digna de registo neste mapa é Almeirim, mas por motivos gastronómicos. Não, não é a sopa de pedra, que é um assombro, nem os sumos Compal, que também não são nada de se deitar fora. O que me vem à memória quando falo em Almeirim é o Magusto de Bacalhau, meus senhores, que, com tanto mosteiro, convento e igreja a rodear deve ter sido criado a partir de uma receita de deus. Só para terminar, e dando razão ao Nobel português, uma perguntinha aos caros leitores da zona centro: onde foram buscar essa imensa lua brilhante que vocês têm?

fotos 1, 2, 3

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Momento Monty Python

-IPPAR?
-Não! EPUL...
-EPUL?
-IPPAR!
-IPPAR?
-EPUL!
-Ah! EPUL!!!!
-EPUL??? EPAL!!!!!!!

Se um deste dias acordarem sem água em Lisboa, já sabem do que foi...

Espreitar aqui

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Lições Berardo

Há pouco assisti num serviço informativo às imagens da inauguração do Museu Berardo no CCB e da controvérsia instalada com António Mega Ferreira. Polémica à parte, detive das palavras de Joe Berardo as lições com as quais o país teria muito a beneficiar, caso os ensinamentos fossem aplicados:

Lição nº1: quando há alguma coisa que está a correr mal é cortar o mal pela raiz.

Lição nº2: ele (Mega Ferreira) como não fez nada, deve sair.

Lição nº3: se ele está com problemas de saúde ou tem problemas mentais que se vaia a curar.

Conseguem imaginar a aplicação destas premissas na política nacional?


Entrevista aqui

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segunda-feira, junho 25, 2007

Nostalgia

Os post's acabaram. Agora escrevemos e publicamos mensagens. Para um indivíduo que anda nisto há quatro anos, a mudança lexical do blogger é sentida como uma traição. Não se faz. Já não postamos, mensajamos. No topo esquerdo do ecrã onde estou a escrever este post, perdão, esta mensagem, aparece-me «Envio de mensagens». A quem?

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O perfume da maresia

E de um texto nasceram mais.
Obrigada.

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a minha aldeia...

Sou uma menina da cidade. Nasci na cidade grande e sempre morei na cidade. Já os meus pais moravam na cidade e as minhas avós também cá andavam. Conclusão, nunca tive uma aldeia minha...


A minha aldeia tem ruas estreitas e sinuosas de paralelos tortos... ou ruas direitas e amplas – ainda não decidi. A minha aldeia tem casas de pedra encavalitadas... ou casas caiadas muito bem alinhadas – ainda não decidi! A minha aldeia tem em volta um vale recortado... ou planícies imensas – ainda não decidi. Acho que a minha aldeia tem um rio... ou um ribeiro – ainda não decidi –, mas um daqueles que «não faz pensar em nada» e que «quem está ao pé dele está só ao pé dele». Na minha aldeia, o azul é do céu e o verde é dos campos. Na minha aldeia, come-se sentado em casa de volta da mesa ou em roda do meio do monte. A minha aldeia tem recantos escondidos e portas abertas. A minha aldeia tem gente! Tem gente que conversa, tem gente que se conhece, tem gente que cumprimenta quem passa, tem gente que conta histórias, tem gente que sabe esperar, tem gente que vive devagar, tem gente que sabe ouvir, tem gente com memória... Na minha aldeia, «sinto mais longe o passado» e «sinto a saudade mais perto», apenas porque, na minha aldeia,... sinto!



Na minha aldeia a vida é maior...
A minha aldeia não é a minha cidade...



[Excertos de Alberto Caeiro ("O Guardador de Rebanhos") e Fernando Pessoa ("O sino da minha aldeia")]
imagens: Montalegre (1) (2) e Castro Verde (3) (4)

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Sofá vazio

Na véspera, ele disse que iria ele ver o meu pai. A minha mãe anuiu e eu concordei. Quando regressou, vinha tenso e pálido, com o rosto cerrado e disse baixinho, quase inaudível, julgo mesmo que nós as duas, baixitas e expectantes, lhe pedimos que repetisse o que dissera. Soltou então, como um sopro, como eu julgo ter partido o meu querido pai, Faleceu e repetiu Já faleceu. Abraçámo-nos os três e chorámos ali mesmo, no átrio do hospital, baixinho, abraçados sempre como se um fôssemos. E depois, vieram os amigos, a igreja e as flores, e depois, deixámos-te, meu querido pai, naquele sítio onde ainda só uma vez fui, e depois vieram dias e noites e mais dias. Dias há em que penso ainda que irei encontrar-te de sorriso aberto, sentado no teu sofá de eleição, esperando-nos ansioso, pela hora do almoço, refilando com uma notícia da televisão ou presenteando-me com uma peça de fruta, escolhida com o teu carinho único, Toma, escolhi para ti. A casa tornou-se enorme sem ti e o sofá continua vazio.


O momento passado que escolhi quando fui gentilmente convidada a participar Nestes momentos.

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domingo, junho 24, 2007

A minha é assim

A minha Ericeira é uma parte da minha adolescência. O mar da minha Ericeira riu-se de mim quando tentava aprender a surfar e aplaudiu, tenho a certeza, a minha decisão de nunca mais o fazer. A minha Ericeira é frequentar o bar de Ribeira d'Ilhas e perceber que um olhar muito "em cima" pode deitar por terra um "trabalho" de sedução começado há horas, por vezes dias, a uma cachopa. A minha Ericeira é o sítio de descanso no meio do treino de ciclista: Sintra, Lourel, Terrugem, S. Julião, Ericeira, pausa para restabelecer, retomava em direcção a Mafra, Cheleiros, Pero Pinheiro, Terrugem, Lourel e Sintra, de novo, mais morto que vivo, depois deste calvário com cerca de cinquenta quilómetros, tão plano quanto uma montanha russa. A minha Ericeira sabe que já tomei banho à meia noite no seu mar. A minha Ericeira tem a memória vergonhosa, que guardou em absoluto segredo, como boa amiga que não troça dos seus companheiros, do ataque de tosse provocado pelo primeiro cigarro que tentei travar. A minha Ericeira tem uma extraordinária qualidade: não há nenhuma parte dela que eu possa considerar como não sendo a minha Ericeira.

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sábado, junho 23, 2007

Vergonha

O post até tem estilo, está escrito com verve e as ideias estão bem organizadas. Mas eu tenho vergonha dele. Tenho vergonha que ele seja a narrativa de um facto e não fruto da imaginação do autor. Tenho vergonha daquele excesso de zelo, daquela alucinação de quem acha que as pessoas comuns têm computadores que se auto-formatam. Tenho vergonha de se ter apreendido uma tese de doutoramente por meio ano. Acima de tudo, tenho vergonha que os meus impostos sirvam para pagar horas extra àqueles funcionários públicos e tenho vergonha que o meu voto, independentemente da cor, sirva para legitimar um Estado e um sistema que trata assim os seus cidadãos.

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não! não é...

O programa semanal da Antena1 da dupla dos «não é?», hoje de manhã, começou com a catalogação do S. João como sendo «a festa mais estúpida do far-west»... Desculpem????!!!!... O senhor «não é» ficou um bocado sem fala perante a perentoridade de tal afirmação – apreciei o engasgo! O proclamador trata então de realçar a estupidez que é o povo sair à rua todo à martelada... Ainda algum silêncio diplomático da outra parte e uma indignação crescente do lado de cá do aparelho... Esclarece ainda que diz isto de forma carinhosa... Sustive a vontade de exteriorizar o que sentia violentamente sobre o rádio. Fiquei a pensar... ... ... Não! No estado interior que eu já estava, «a festa mais estúpida do far-west» não é carinhoso! Ouvi o resto do programa de pé atrás e até os «não é?» me voltaram a incomodar solenemente...

'arago, p´ró 'arago... Bibó, S. Juom!

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sexta-feira, junho 22, 2007

E a tua?

E a tua? Como é a tua Ericeira? perguntava eu aqui. Bekx aceitou o desafio e mostrou-nos a sua Ericeira. Aqui está a prova que cada um de nós tem a sua terra, igual e diferente da de todos os outros. Obrigada pelo contributo e pelas palavras.
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playing Miss Pearls... [4]

O contentamento... de alguns! :)
[ou, confusões à parte, um post com dedicatória...]

Sáb. 8h00: o Parque
Visita guiada ao Parque. Cheguei atrasada e já fora do limite das 25 pessoas, mas àquela hora o Parque estava deserto e portanto, não houve problema em encontrar o grupo e juntar-me às perto de 40 pessoas que decidiram madrugar para a Festa. A história do crescimento e construção do Parque, num passeio matinal calmo e agradável. Terminou no celeiro com a oferta de um pequeno-almoço com chás, pães e compotas inteiramente produzidos no Parque. Veio mesmo a calhar, pois para além de chegar atrasada ainda só tinha ingerido pelo caminho um daqueles iogurtes pequeninos que regulam o trânsito intestinal.

Dom. 13h00: os espaços arquitectónicos
Reparo que tenho um "buraco" no programa mesmo a jeito da visita aos espaços arquitectónicos. Outra excelente visita onde nos chamaram a atenção para as entradas de luz, as aberturas para o exterior, a versatilidade das salas, a adequação do espaço envolvente, a preocupação de integração, as analogias passado-presente,... Aprendi a ganhar outro respeito ao trabalho dos arquitectos.

Sáb. 23h00: as exposições
À hora marcada, na entrada do Museu para seguir a visita das exposições. «O que é uma exposição?» «O que é um desenho?» «O que nos está a dizer o artista?» Um guia com a mania que é animador cultural... Foi interessante! A visita termina no exterior do Museu, para analisar as pérolas de Massimo Bartolini. Pergunta o guia: porque é que as mulheres usam jóias? Após algumas respostas tímidas do grupo e antes de concluir que as pérolas de Bartolini não embelezam o Museu, apenas realçam as suas formas belas, esclarece, galanteador (?), que as jóias não tornam as mulheres bonitas, apenas realçam a sua beleza!
[fim]
imagem: Miss Pearls

[parte1] [parte2] [parte 3]

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quinta-feira, junho 21, 2007

Boas Práticas

Alguém me explica como é que numa altura em que se dedica alguma atenção aos hábitos alimentares, em que se sensibilizam os jovens para não saltar refeições e para os benefícios de uma alimentação equilibrada e saudável, o Ministério da Educação calendariza o exame de 11º ano de Matemática Aplicada às Ciências Sociais, com a duração de duas horas e meia, para as 11.30 da manhã, obrigando assim os examinandos a fazer o exame em plena hora de almoço? Alguém que diga aos senhores da 24 de Julho que fazer exames exige concentração, envolve stress e desgaste e que certamente haverá outras horas do dia mais convenientes a bem dos alunos.

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Silêncio, que se vai cantar Glory Box

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Minha

A minha Ericeira não é a Ericeira de Agosto. Não é a Ericeira do Verão desenfreado, das tias ostentando o ouro baço, martelado ou branco e marcas da moda pretendendo aparentar sempre uma boa dezena de anos a menos, dos cavalheiros bem falantes de cabelo lambido e olhar pegajoso, como se adivinha o cabelo.
A minha Ericeira não é a Ericeira dos Domingos, das fatiotas domingueiras com rostos domingueiros e perfumes rascas também eles domingueiros. A minha Ericeira não é a Ericeira do marisco do e no início de cada mês, dominical por certo, das gentes que alarvemente se despenham em ruídos entre percebes e sapateiras e exalam, nesse meio tempo, o odor domingueiro das cidades suburbanas, bolorentas.
A minha Ericeira não é a Ericeira dos impessoais monstros de betão. A minha Ericeira não é a Ericeira dos donos dos monstros de betão. A minha Ericeira não é a Ericeira de alguns dos habitantes dos monstros de betão. A minha Ericeira usa chinelo e fala a língua das gentes despretensiosas.
A minha Ericeira é simples, ornamentada com a sua própria beleza natural, enfeitada com a grinalda de espuma das marés violentas. A Ericeira da bruma. A Ericeira do Inverno e da Primavera, apenas a azáfama das suas gentes, sem a gente de Domingo suburbana, muito mais suburbana do que se pensa, mais saloia até, mas nunca jagoza.
Passear a Ericeira numa manhã soalheira, igual em que estação, é uma dádiva dos deuses. Quem sabe se Vénus e Neptuno não terão por aqui se amado com o sentir ardente dos corações arrebatados. Terá nascido esta terra e este mar, o salgadiço no ar, da virilidade ondulante de Neptuno mesclando-se na sensualidade doce de Vénus, apadrinhados por Éolo obstinado? O céu atinge um azul indefinível e a calmaria, apenas a espaços entrecortada por um chinelar vigoroso dos filhos desta terra de mar ou um chamar convicto e forte, constitui uma terapêutica preciosa.
Esta minha Ericeira é a Ericeira do linguajar próprio, sempre rápido, sempre rude, abrupto e desabrido, do perfumado aroma a maresia pelas ruelas alvas, inconfundível e ímpar, como nunca, nunca em outro lugar do mundo senti, do mar bruto e gélido. Também das gotículas que dele saltitam para nos brindar.
Esta minha Ericeira é a Ericeira dos pássaros a chilrear no Jogo da Bola, do fumo das castanhas no Outono, do mar rebelde nas Furnas, do cheiro a peixe grelhado pelas ruas do Norte. A Ericeira dos bolos e batatas fritas na praia do Sul, dos retemperadores finais de tarde na esplanada, estação obrigatória entre a agitação do dia e o bulício da noite vindoura.
Esta minha Ericeira é também a Ericeira da brisa marítima e da neblina, das noites longas e das ondas grandes, das pevides à porta da Igreja. O casario caiado, limpo, puro. Esta minha Ericeira é mulher caprichosa que apenas se mostra quando quer, e que como as mulheres caprichosas e belas, só se deixa sentir quando entende e se entende, como se muitas vezes medíssemos forças, em vão, com a natureza impetuosa para nos fazer sentir, a espaços, o sabor da vitória conquistada, como com as mulheres caprichosas. Mulher caprichosa e bela, egocêntrica também, única filha única do amor desenfreado entre Vénus e Neptuno. E a tua? Como é a tua Ericeira?

Foto: gentilmente cedida por um amante da Ericeira

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playing Miss Pearls... [3]

«Eu pensava que Serralves era uma seca... Isto até é fixe!»

É, de facto, uma festa para toda a família, onde as crianças conseguem ganhar um espaço programático importante. As marionetas e os circos estavam todos cheiinhos de famílias, de crianças saltitantes e de pais semi-stressados. E em todas as oficinas dava gosto ver pais e filhos, juntos, de volta das madeiras, dos papeis, dos lápis, das colas e das tesouras. Nem sei bem quem mais se divertia!...

O anoitecer de domingo lembra-me que tenho horas para estar noutro sítio, fora de Serralves, fora da Festa... Sentada na relva tomando lanço para deixar tudo para trás, faço um balanço mental claramente positivo e constantemente interrompido pela vontade de voltar em pleno para o ano...

[cont.]
Eu prometo que acaba na próxima... Está bem?
[parte1] [parte2]

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Vou ser pai!

A vida, felizmente, é vivida e partilhada com amigos, e um encontro de amigos deverá ser sempre uma festa, mas, e se nesse encontro, um amigo nos comunicar o drástico: vou ser pai! Caso pertençamos, ou não, à classe, iremos rejubilar e bater-lhe nas costas e transmitir uma mensagem muito positiva, qualquer coisa do género:

prepara-te para as alegrias, mas acima de tudo, nos primeiros tempos, para as noites mal dormidas.

Um dia destes a equipa do "GR" teve a oportunidade de abrilhantar um amigo comum com tal frase.
Sabem lá a algazarra que foi!

Foto

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Questões metafísicas

"o Y é sem dúvida o blogue que debita mais lugares-comuns por metro quadrado. Um verdadeiro must!"

Esta afirmação de um anónimo, relança questões curiosas, daí considerar muito mais pertinentes os blogues que permitem comentários anónimos. Um comentário que se refugia numa expressão comum (lugares-comuns) para analisar um blogue, pretende dizer-nos que não gosta do que lê aparentando uma certa objectividade, a frase, em si mesma, pode ser encarada como tal, para tal argumentaremos também, muito jocosamente, avaliar a escrita de alguém com uma representação escrita semelhante àquilo que simboliza o que eu vejo de negativo no outro, também não deixa de ser simpático; contudo tal afirmação também poderá revelar uma inteligência irónica muito acutilante, criticar a escrita do outro indo naquele sentido e ironizando sobre a própria vulgaridade da crítica, por exemplo.
O interessante da comunicação é que a interpretação de uma determinada afirmação revela bem mais de mim do que eu pretenderia, bem como do seu autor.
A literatura sobre comunicação escrita aponta o caminho na direcção de todos contribuirmos para a criação das regras de comunicação na internet, isto é, criar uma espécie de protocolo, etiqueta de comunicação, quando "falamos" por escrito, na Internet, com alguém.
Estaremos dispostos a isso?
Ou teremos de aprender a interpretar os outros retirando a nossa carga cultural, os preconceitos, a educação e, fundamentalmente, a emoção, encolhermos os ombros e seguirmos em frente?
Apesar de, certos teóricos comunicacionais apontarem nos dois sentidos anteriores, alguns recusam-se a aceitar a emoção como uma espécie de revelação da personalidade do ser humano e da sua necessidade de "explosão" exterior, através da comunicação.
Quando leio escritos sobre a bondade, a virtude, aprecio a argumentação do autor, sorrio, e sigo em frente.
Enfim, há várias maneiras de nos auto-enganarmos e pressupor que o ser humano é apenas a preto e branco, é uma teoria muito interessante, mas nada mais que isso.

Perguntas cuja discussão poderia ser relevante:
O que é um blogue que debita lugares comuns?
O que é um lugar-comum?
O que é a ironia?
O que é um insulto?

Mas, para discutir sobre o que quer que seja, deveríamos ouvir/ler os outros e tanto aqui (mundo virtual) como lá fora (mundo real) o exercício é mais ao contrário, um desperdício.

ilustração

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quarta-feira, junho 20, 2007

playing Miss Pearls... [2]

Apesar de duvidar um bocado da minha permissão - posso?... -, cá vai mais um bocadinho da minha Festa:

«Ó mãe! E podemos ir para cima da relva?!...»

A relva é uma constante da Festa. Quase todas as actividades ao ar livre começam e terminam com pessoas a sentarem-se na relva. Umas mantas?... Pode ser, mas não é indispensável...

No Redondo das Cameleiras sento-me sossegadinha ainda de sande na mão (o meu almoço!) para ouvir a lenda da moça da fonte – espaço fenomenal! parecia criado propositadamente para o contador de histórias que assumia as personagens e nos fitava de olhos arregalados. Depois de almoço e a meio da tarde, sento-me no Prado, onde um grupo de percussão de uma escola profissional recria uma espécie de espírito Stomp. Surpresa agradável e um público, acho que também, surpreendido!

No domingo, sossego sentada à sombra disfarçando um pequeno almoço fugido ou um almoço apressado ao som de pequenos trechos musicais: Sons na Paisagem. Agradável! Com o entardecer, já com muitas horas em cima, corro para o Prado, onde acabo por me refastelar muito bem refasteladinha no meio da relva a ouvir um bocadinho de jazz. Momento de descanso bem musicado.

[cont.]
[parte 1]

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Pelos caminhos de Portugal

Há uns anos, resolvi alugar uma Ford Transit, com dois grandes amigos, e partir rumo ao Portugal Profundo: Trás-os-Montes.
Éramos três jovens adultos, com alguns interesses incomuns.
O mais comum era um apreciador convicto de Maria Bethânia, Simone, Chico, Caetano; um dos Cure, Joy Division, Cocteau Twins, The Smiths, e também o catálogo da Rough Trade; e, por fim, outro de Tina Turner, Nina Simone, Ray Charles, música da alma, dizem.
Durante o trajecto tive a grata oportunidade de reequacionar a reflexão: gostos musicais versus viagens de longo curso versus amigos logo teste à capacidade de (in)tolerância.
Entretanto alguém continuou a detestar, firmemente, Maria Bethânia.

Trajecto:
1 - Coimbra rumo Bragança, com algumas paragens, amiúde a recontagem dos trocos inseridos na caixa comum, que servia, nomeadamente, para o gasóleo da velha Transit.
Percorremos em primeiro lugar, Bragança, há 15 anos, era uma cidade muito feia e descaracterizada, gostei apenas dos seus monumentos históricos, de resto detestei a envolvente: prédios sem o mínimo de estudo urbanístico, casas velhas, lixo.
2 - Rio de Onor, uma aldeia no parque natural de Montesinho, muito bonita, reconstruída, mas apenas com meia dúzia de habitantes, como diz a reportagem do sapo, ali está-se fora do mundo, lembro-me nitidamente no cantar da ribeira e do café da aldeia, por lá ficámos a ver correr o tempo, durante um dia e meio.
3 - Miranda do Douro, adorei a cidade, aliás foi, sem dúvida a minha cidade preferida. Apesar de a envolvente extra-muralha prosseguir o crescimento desenfreado e sem ordenamento, o centro, bastante cuidado, limpo e conservado era um convite ao passeio, apesar do calor infernal, próprio de Agosto. Lembro-me nitidamente de ter encontrado um colega de faculdade apreciando a paisagem do rio e a sensação muito nítida do "afinal, ele há coincidências!"
Regresso a Coimbra, após uma semana de trajecto. Quando cheguei a casa o que mais me agradou foi ter finalmente dormido numa cama e ter tomado um banho decente. Foi com esta viagem que perdi a inocência acerca do acampar, depois disso, só o fiz uma vez mais, e, relembrei, amiúde, o desconforto da outra viagem por terras de além montes.
Não sei o que é isso de «interiorizações perfeitas», prevejo, no entanto, uma séria candidata:
viajar? só com cama pelo meio.

Fotos 1, 2 e 3

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terça-feira, junho 19, 2007

playing Miss Pearls... [1]

Miss Pearls foi a blogger-repórter do Expresso na Festa de Serralves. Eu não tive bilhete de primeira classe no alfa, não tive estadia paga num hotel, nem recebi 150 € para despesas. Mas também lá estive e tinha um passe Andante Z4, uma senha de 10 viagens dos STCP e uns trocos na carteira – é parecido! Também tinha uma máquina fotográfica e uma assumida falta de jeito, mas não tive tempo de a demonstrar! Agora, fazendo uso de uma licença não pedida – ainda! –, trago aqui uma visão da minha Festa a la Miss Pearls... Posso? Posso?...

«Agora escolhes tu! Tu nunca gostas do que eu escolho!»

A consulta do meu programa começou durante a semana na visita ao site e continuou fim-de-semana adentro sempre de livrinho na mão em cada tempinho livre. Tudo somado devo ter olhado para aquilo umas boas duas horas – não estou a exagerar! Há tanta coisa, em tantos sítios que corria sérios riscos de me perder em actividades ou espaços. Chamo a atenção para um detalhe importante: a impossibilidade de tele-transporte entre o fim de uma actividade e o início de outra!!! – foi uma coisa com que não contava, mas que cedo percebi e tive de me resignar...

Há de tudo: experiências que nos surpreendem e momentos que se dispensam...

Na minha estreia no Auditório, a dupla das vassouras diverte grandes e pequenos, gerando risos e gargalhadas sinceros e genuínas. Ao fim da manhã, no Ulmeiro, prepara-se uma apresentação de dança contemporânea e fico para ver... – demasiado estranho, ainda por cima sob a etiqueta "indicado para crianças e famílias"! A meio da tarde, acelero o passo para o Ténis onde os Bal Moderne ensinam 3 min. de coreografia durante 45 min. para todos os que quiserem levantar o rabinho das cadeiras – um bocadinho... sei lá... parolo, mas até não ficou nada mal! Troco a segunda coreografia pelo Circo de Madeira no Arboreto: muita gente, muitas crianças, muitos pais,... no fim de algum trabalho de ordenamento da plateia, todos acabam por ver o palhaço faz-tudo, o malabarista, o trapezista, o domador, os dançarinos,... – manipulação divertida e agitação bem humorada! Ao fim da tarde, rumo ao Parterre Lateral para ouvir algumas Lembranças: em grupos pequenos e saltando de cantinho em cantinho vamos assistindo a representações individuais num sentimento de partilha mútuo – gostei do conceito!

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Parabéns, Chico!



Foto daqui
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Um cordeiro na pele de lobo

A política portuguesa, nos últimos 30 anos, revelou figuras muito curiosas:
- Os capitães de Abril - existem contestações óbvias ao comportamento dos militares do 25 de Abril, contudo é inegável a leitura positiva da sua actuação: a devolução da liberdade à sociedade portuguesa, libertando-a do cinzentismo do Salazarismo e do pensamento único. Contudo a determinada altura tornou-se evidente a perigosidade do seu estreitamento ideológico e as consequências drásticas a que tal poderia ter conduzido;
- Ramalho Eanes - é um militar emblemático e com um valor muito esclarecido acerca do que é a liberdade. É uma das personalidades políticas portuguesas a quem devemos a permanência em liberdade, a sua actuação numa determinada época foi crucial.
- Álvaro Cunhal - Um político sério, autoritário, inteligente, com uma grande capacidade de manipulação, cuja batalha, se tivesse sido ganha, ter-nos-ia conduzido a outra versão do pensamento único, a expressão eufemística: ditadura do proletariado;
- Mário Soares - a sua importância histórica incontornável, a sua empatia com os media, e o consequente endeusamento. Não há ninguém com um poder comunicacional tão histriónico como o ex-presidente da república. Ele consegue dizer as maiores barbaridades e pôr a classe jornalística a salivar de uma forma contemporânea o que me parece extraordinariamente cómico e louvável.
- Sá Carneiro - era um político muito sério e com ideias muito próprias para um determinado Portugal. Sá Carneiro, tal como Cavaco, também conseguiu fintar, muito sub-repticiamente, a classe dos comentadores políticos. Demonstrou à opinião pública que a sua seriedade era extraordinariamente humana, para alguém que até ali tinha veiculado uma imagem fundamentalmente autoritária, constituiu uma revelação.
- Freitas do Amaral - Pelo que eu conheço do seu percurso político, parece-me que estamos perante alguém com valores muito cristãos e humanos. A sua única ideologia é a interiorização da necessidade da tolerância para lidarmos construtivamente uns com os outros. A sua tolerância zero à intolerância é simbolizada, recentemente, através das suas afirmações sobre as caricaturas de Maomé.
- Francisco Louçã - é um político extremamente hábil, inteligente e com uma grande capacidade de manipulação dos media.
- Cavaco Silva - interiorizou a necessidade de uma postura muito séria na política. Está na política com o ideal de serviço público, tendo na mira o sentimento patriótico, tão incomodativo para determinadas ideologias.
- José Sócrates - é um político muito determinado, teimoso e que sabe o que quer. Leu a necessidade de uma postura autoritária e séria na política, contudo comete um erro de avaliação: para se chegar à opinião pública é preciso, acima de tudo, fazer de conta. Sócrates precisa de interiorizar a seriedade como comportamento e a humanidade como atitude. Se tivesse encarado os "problemas" da licenciatura como uma oportunidade de se humanizar, teria calado a oposição, agora está a braços com as graçolas inerentes ao caso e o ruído de fundo que se traduz na seguinte expressão: é nos momentos difíceis que damos a conhecer o nosso carácter.
- Paulo Portas - a interiorização errada de que seriedade (comportamento) se traduz através do populismo (atitude). Se tal atitude resulta nas autarquias, pois o povo continua a fazer o seguinte raciocínio: proximidade, simpatia do presidente = seriedade, num líder político é mortal: pois só em altura de eleições é que o líder político se relaciona de uma forma mais directa com a população, daí que se torne, muito facilmente, alvo de chacota.

Concluo então o seguinte: o fundamental para um político é a capacidade de transmitir um comportamento de seriedade e autoritarismo através de uma certa humanidade, mas, tudo isto a favor de uma única ideologia: o engrandecimento de Portugal.

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Também se aplica a abstémios

Podem visitar os menires, podem admirar a vila altaneira à planície alentejana, podem achar o Forte de S. Bento um espanto, podem apreciar a arquitectura árabe nas suas casas caiadas, podem arrebatar o palato com Açorda de Peixe do Rio, podem descobrir ruas labirínticas, enfim, podem deleitar-se com uma miríade de maravilhas. Mas, por favor, nunca digam a ninguém que visitaram Reguengos de Monsaraz e que não beberam o seu majestoso vinho. Isso é pior do que ir a Roma e não ver o Papa. Mesmo para ateus. Como é o caso.

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segunda-feira, junho 18, 2007

praia do Barril

Manhã cedo, porque a viagem ainda é longa e todos querem aproveitar bem o tempo, toca a carregar o carro: sacos, toalhas, guarda-sóis, pára-vento – sim, porque nesse dia estava sempre vento! – brinquedos, raquetes, bolas e lancheira preparada para o dia passado fora. 10 min depois da partida: «Ainda falta muito?...» «Falta!»

Muitas perguntas depois, finalmente, o «Ainda falta muito?» tem uma resposta positiva. Já se vêem as casinhas de Pedras d'el Rei. Chegamos à ria. Estaciona-se e toca de tirar do carro: sacos, toalhas, guarda-sóis, pára-vento, brinquedos, raquetes, bolas e lancheira. Uff... Ainda falta para chegar, mas aproxima-se um dos momentos mais ansiados: o comboinho! Antes disso, ainda a ponte... Por causa dela, havíamos trocado os chinelos pelas sandálias, não fosse algum ficar preso nas tábuas mal alinhadas. Guardam-se os chapéus para não voarem e cá vamos nós alegremente pela ponte flutuante que abana à passagem dos visitantes e muda de configuração ao sabor das marés...

O comboiinho!!! "Confortavelmente" instalados, com a mão direita a segurar o saco, a esquerda a agarrar a criança que se abraça ao seu balde, o pé direito a fixar o guarda-sol e a perna esquerda a amparar a lancheira, a cabeça gira como pode para espreitar a fuga dos caranguejos à passagem barulhenta do comboio. Tu-tu tu-tum tu-tu tu-tum... Como eu gosto de andar no comboinho! Uma pausa a meio do curto caminho, para permitir o cruzamento com o segundo comboio – vazio! – em sentido contrário. Chegamos à praia! Volta a carregar o saco, a toalha, o guarda-sol, o pára-vento, os brinquedos, as raquetes, as bolas e a lancheira.

Uma pequena caminhada até ao espaço perfeito que combina as dunas, o areal, e o mar. Monta-se o "estandal"! «Já posso ir para a água?» Desta vez, a resposta é afirmativa à primeira, pois o tempo da viagem havia já permitido a digestão sossegada do pequeno-almoço. A água límpida e carregada de algas verdinhas aguça e retrai a vontade do mergulho; mas devagar, devagarinho e procurando o melhor local, a gente habitua-se [ou não!] àquela presença estranha. Um grande passeio pelo areal imenso é acompanhado pela recolha de conchas, búzios e pedrinhas. Hora da construção: uns túneis, uns castelos, uns desenhos de dedo espetado na areia – tudo cuidadosamente aprumado. Uma voltinha de gaivota é motivo de festa. Mas, para além do comboiinho, um outro ponto forte do dia também se faz ouvir à distância: «boliiiiiiiiiinhas!!!» – é que, de facto, as melhores bolas de berlim sem creme são as da praia do Barril; não há dúvidas!!!

O dia começa a chegar ao fim... Arrumam-se os sacos, as toalhas, os guarda-sóis, o pára-vento, os brinquedos, as raquetes, as bolas e a lancheira. De novo o comboiinho... De novo a ponte... Ainda dá para um mergulho na piscina e uma bola de gelado em Pedras d'el Rei. O pôr do sol põe-nos Tavira no horizonte para um passeiozinho nocturno. E, completamente rota, a viagem de regresso é uma viagem santa no carro que de manhã tanto se havia impacientado... Para o ano há mais!...

imagens (1) (2) (3)

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O Tibúrcio

O Tibúrcio é um professor responsável. O Tibúrcio cumpre prazos. O Tibúrcio é pontual. O Tibúrcio é recto e corta a direito. O Tibúrcio cumpre programas. O Tibúrcio aparentemente não faz mal a ninguém. O Tibúrcio tem alguns problemas. O Tibúrcio gosta de poleiro. O Tibúrcio gosta de lamber umas quantas botas. O Tibúrcio, debaixo do seu ar de cordeiro obediente, é um ditador. O Tibúrcio gosta de poder, gosta de se sentir grande e para se sentir grande tem de ter coisas, tem de ser coisas e, lambendo algumas botas e esboçando os sorrisos certos nos momentos certos, foi sendo coisas. Essas coisas são agora contabilizadas em pontos. O Tibúrcio tem pontos, portanto, portanto o Tibúrcio é grande e importante. Mas o Tibúrcio, além de ser um déspota na pele de cordeiro, tem outro problema. O problema do Tibúrcio é que, por ele gostar de poder e por ser autoritário, tem alguns problemas com os alunos. Por exemplo, os alunos não o cumprimentam nos corredores da escola, os alunos do Tibúrcio não querem ter mais o Tibúrcio como professor se pudessem escolher, porque o Tibúrcio não se sorri para eles, não chega perto deles, na verdade, parece nem querer saber deles, Xô que me podem pegar coisas, Xô gentalha pequena, Quem é grande, quem é? Quem é grande e bom? e este é o problema do Tibúrcio, mas o Tibúrcio, que é professor, não quer saber disto para nada, porque o Tibúrcio é grande e quer ser director, coordenador, director e coordenador e coordenador e director e administrador e orientador e coordenador e director e gestor e director e presidente porque ser só professor é muito pouco.

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domingo, junho 17, 2007

Contraditório

Sou um ouvinte habitual do Contraditório, programa de opinião semanal emitido pela Antena1, e onde Ana Sá Lopes, Carlos Magno, Luís Delgado e Luís Marinho debatem os principais acontecimentos da actualidade nacional e internacional. Esta semana estava particularmente interessado no programa: não podia perder a versão de Luís Marinho (Director de Informação da RTP) sobre o caso que envolveu o Presidente da República e a estação pública de televisão.

O início do programa não foi muito auspicioso, Luís Marinho começou o programa com um «pseudo-acontecimento»*: o roubo do relógio ao presidente Bush. Mas depois de cinco minutos a falar do relógio do Bush, lá entraram na análise a um verdadeiro acontecimento da actualidade internacional: o momento dramático que se vive na Palestina. Depois partiram para o comentário à sondagem da Intercampus que dá a vitória sem maioria absoluta em Lisboa a António Costa, e à análise dos possíveis cenários pós eleitorais. Já estavam nesta conversa há mais de dez minutos quando finalmente se ouve o Luís marinho dizer: “Eu propunha que nesta fase final do programa falássemos de um acontecimento político que parece que começar a ter bastante relevância que é: o papel de Cavaco Silva na actual cena política. Carlos Magno… desenvolve lá a tua tese”. Fiquei espantado com aquela saída da “tese”, mas Carlos Magno começou logo por informar os ouvintes que já tinham falado sobre o assunto nos bastidores. Para bom entendedor, meia palavra basta. Carlos Magno lá começou a desenvolver a sua tese, que defende que o poder do Primeiro-ministro se está a transferir directamente para o Presidente da República, e ainda arranja um tempinho para criticar Cavaco Silva e a RTP. Tenta passar a bola a Luís Marinho, mas este faz questão de dizer que nada tem a acrescentar. Porém, acabou por acrescentar: o que se disse [a RTP] foi que o presidente tinha razão numa parte do protesto dele, que é exactamente não se ter emitido a totalidade da cerimónia.” Tanto a Ana Sá Lopes como Luís Delgado não proferiram qualquer parecer sobre o assunto, o tema passou rapidamente da RTP para o estudo do novo aeroporto de Lisboa e não se falou mais na RTP até ao final do programa.

Conclusão: não é pelo amiguismo que se pode distinguir a blogosfera dos meios de comunicação tradicionais.

* Daniel Boorstin

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O amanhã

Amanhã começa a primeira fase dos exames do Ensino Secundário, tal como noticiado aqui. Na notícia afirma-se que "nesta época de exames as novidades não são grandes para quem se candidata à faculdade ou apenas quer acabar o secundário." Aparentemente não há novidades, é certo, mas tendo em conta a ausência de coerência e consistência que o Ministério da Educação tem evidenciado na sua actuação ao longo do último ano, quase tudo será de esperar. O exame de Física e Química do ano passado, que voltou a ser notícia, ilustra a desorientação. O que espera aos alunos este ano nem Maria de Lurdes Rodrigues sabe. O mínimo exigível a um governo que utiliza a palavra rigor tão amiúde seria exactamente rigor e, já agora, respeito pelos alunos que durante os próximos meses darão mais um passo no caminho do futuro.
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#momento Zen#











O seu lema indefectível:
interiorizar a palavra descontração como a capacidade de saber mergulhar em emoções e não se afogar... num mar de (in)certezas.

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sábado, junho 16, 2007

Uma marquise em Campo de Ourique

E enquanto o país estava suspenso pela vitória de Cavaco Silva nas presidenciais e se aguardava a reacção do dito, as transmissões televisivas centravam-se na residência sita na capital lusa. Além de ter de digerir um presidente que não assumiu qual o seu escritor preferido, ou o seu vinho de eleição para não ofender os restantes escritores fora do rol do eleito ou os néctares eliminados, a caixinha mágica deu-me ainda uma outra perspectiva do homem de Boliqueime e que se não fosse este excelente post do Pedro Correia, estaria agora ali a estupidificar-me com o jogo dos sub-21 em vez destas afagadelas no teclado e nem me teria lembrado desse episódio triste da história contemporânea. O homem que tinha doravante o destino de todos nós nas mãos tinha uma marquise, uma marquise destas com estores e tudo e a contra-luz desenhava-se a silhueta do casal presidencial. A culpa é da República, pois claro, os reis não têm marquise e não são eleitos, portanto ter-me-iam poupado mais este desgosto. Guardo desde então a crónica de Ricardo Araújo Pereira da "Visão" de 26 de Janeiro de 2006: “Na minha opinião, há determinadas partes da casa que um Presidente da República não devia frequentar. A marquise é uma delas. (…) Quando se lembram da sua rainha, os britânicos, imaginam-na na sala do trono. (…) A mim, quando penso em Cavaco Silva, só me ocorre a imagem do novo Presidente a falar ao telefone na marquise.” Não posso concordar mais. Cavaco Silva cultiva a imagem de homem do povo, diz-se, um self-made-man à algarvia, o pobrezinho sofreu como se sabe aquando da viagem à Índia com a comida picante, passou tão mal o casal presidencial que o que lhe valeu foi o arrozinho branco, benzó deus, mas não precisava de ter uma marquise, precisava?
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Bloomsday


Hoje a literatura está na rua em Dublin.
16 Junho de 1904, o dia em que se desenrola a acção de Ulisses de James Joyce, é comemorado pelos fãs do escritor também noutros locais do mundo e assinalado com eventos diversos no local do périplo de Leopold Bloom. Proponho, portanto, que façamos um desvio do percurso iniciado aqui e que nos encontremos em Dublin para uma Guinness.

Imagem daqui

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Duelo ao Sol

«[...]
Baptista-Bastos: Quando os soviéticos tomaram o Poder havia na Rússia mais de noventa por cento de anafalbetos. Em menos de vinte anos resolveram esse problema, entre muitos outros, também de capital importância. Quer comentar?
Lucas Pires: O acesso à leitura, só por si, não é uma forma de liberdade. Quem nos diz, de facto, que a literatura soviética actual não corre o risco de ser um imenso livro único?
Baptista-Bastos: Não respondeu à minha pergunta.
Lucas Pires: Respondi a outra, mais importante.
[...]
in Baptista-Bastos, "Um Homem em Ponto - Entrevistas", Relógio d'Água, 1984

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A corrupção segundo o Ti Zé das Couves

Estava no outro dia na merceariazinha da venda, quando surge esbaforido o Ti Zé das Couves.
- Ora ponha aí um martini, ti Maria - disse muito agitado e sempre a espreitar a porta.
Estranhando tal comportamento perguntei-lhe:
- Ó Ti Zé, afinal o que se passa?
- Ó rapariga, se soubesses a minha vida! Meti-me cá numa alhada. Então no outro dia o Manel deu-me uns dinheiritos pra eu fazer avançar um processo e então não é qu'o fdp foi criticar-me na taberna do António?
- Ó Ti Zé, mas você não imaginava qu'isso podia acontecer? Mas o que fez não é correcto, sabe qu'isso dá direito a prisão? Chama-se corrupção.
- Ó rapariga, eu não quero lá saber como s'isso chama, o qu'eu sei é qu'esta foi a forma qu'eu encontrei d'ir sacar o meu IRS. Os meus objectivos todos os anos eram esses. O estado saca-nos e a malta tem de sacar o estado. É simples.

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sexta-feira, junho 15, 2007

Perguntem-lhe o resultado

Hoje que o país é avassalado pelas quezílias do clubismo fervoroso, não se pode viver sem pensar nele, o mais calmo dos adeptos e o mais fervoroso benfiquista. Revela-se tranquilo, lento no andar, pouco apressado no linguajar e descomplicado na alma. E assim se apresenta, escondendo involuntariamente a sua clubite febril. Há algum tempo já sentávamo-nos a uma mesa, quatro jovens estudantes de letras. Sobre a mesa excertos da versão original de A Oeste Nada de Novo narrando um facto na História da Humanidade. Ele, não obstante, mantinha-se impassível e inalterado perante as descrições de costelas trespassadas com baionetas e ratos alimentando-se de imberbes cadáveres nas trincheiras enlameadas. Pouco lhe tocou a agonia dos gaseados e continuou, indiferente e alheado, saboreando umas deliciosas bolachas directamente do pacote. Tudo normal. A sensibilidade é um direito e cada um sente como quer, pode e sabe. Nada de novo, portanto, nem a Oeste nem a Leste, não fora o nosso fervoroso adepto objector de consciência.
Nesse mesmo tempo, recostando-nos tranquilamente na preguiça de nada fazer numa esplanada da capital, dirigiu ele um pedido delicado ao empregado de serviço. O que desejava era água. Água, tão-somente água, pedido satisfeito de imediato. Aparentemente, entenda-se, pois ao colocar a garrafa sobre a mesa, o nosso adepto reformulou o seu pedido Não tem antes…? ao que se seguiu uma qualquer marca de água, desvanecida já na memória. Que gosto requintado, que paladar apurado, pensei de imediato, que quem gosta de água é como quem aprecia vinho: nem todos são iguais nem sabem ao mesmo. A razão do pedido, porém, residia na paixão da sua alma, o clube rubro. Fui, então, informada pelo benfiquista dos sete costados que a dita água pertenceria a um indivíduo com sobrenome de queijadas, possuidor do mais terrível defeito dos defeitos: era sportinguista, lagarto, o das águas, e por conseguinte, a água foi substituída por outra menos verde, e o sorriso regressou-lhe ao rosto.
Tivesse o Benfica existido no tempo em que Moisés presenteou o mundo com as tábuas, teriam constado onze em vez de dez mandamentos: Não pertencerás a um clube verde! com a alínea E muito menos a um azul! E assim ele continuou pela vida, não adquirindo objectos Phillips, por ser a patrocinadora do PSV, equipa responsável pela derrota do seu Benfica em Estugarda, bebendo leite Parmalat, gritando ingenuamente junto do ecrã de televisão Anda, João! Corre, João! Vai, João! e torcendo tanto mais pela selecção, quanto mais jogadores benfiquistas integrar. O João, é sabido, deu-lhe grandes desgostos e acredito que nunca terá recuperado do golpe violento.
Há menos tempo, porém, sentávamo-nos a uma mesa, seis criaturas, estudantes da vida desta feita. Sobre a mesa um belíssimo fondue, excelentemente regado, seguido de um aprazível serão, que atingiu o seu apogeu quando ele exibiu a colecção exímia de bilhetes de entretenimentos passados. Parte da sua vida estava ali perante os olhos dos presentes, um curriculum vitae curioso e único. Pouco lhe serviria para um concurso profissional, é certo, mas constituía um património incalculável no seu percurso pessoal. As memórias mescladas com os afectos. Carinhosamente ia passando revista aos seus bilhetes: cinemas, teatros e bola, bola, e mais bola, bola com fartura. Sim, a bola destacava-se em quantidade desproporcional relativamente às restantes actividades de lazer e, a corroborar este fervor pela redondinha, encontravam-se fotografias a preceito, com cachecóis e bandeiras, barretes e galhardetes. As memórias reavivaram-se Olha, isto foi em …! Ena pá! e mais um bilhete e mais uma fotografia: ele de pé ao lado da bandeira, ele agachado ao lado da bandeira, ele a agarrar a bandeira do lado direito, ele a agarrar a bandeira do lado esquerdo Ena pá! Olha aqui! Vê se conheces este…
E de repente, assim como que possuído por uma força exterior, ordena a um dos presentes, perplexo pela natureza do pedido peremptório, Pergunta-me o resultado! ao que foi prontamente obedecido Qual foi o resultado? Sem hesitar, nem sequer pestanejar, remata com um livre directo o resultado do plantel rubro de mil novecentos e troca o passo. E assim foi enquanto houve bilhetes no seu álbum de recordações, repetindo, até à exaustão, o pedido singular Pergunta-me! Pergunta-me o resultado! De modo que se o virem, perguntem-lhe o resultado. Há perguntas que não têm resposta, uma assim jamais.


Texto que me voltou à memória a propósito deste post.

Imagem daqui

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Locais "secretos"

[clicar na imagem para observar melhor os detalhes]

Fotos: minhas

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O Primeiro Mandamento

Foto: Mike Skelton

Por mera precaução, todos os dias, antes de sair para o trabalho, lá me sento em frente ao PC para ver como encerraram os mercados asiáticos – os norte-americanos, costumo-os ver na noite anterior. Aproveito também para ler as primeiras notícias on-line dos mercados financeiros no Jornal de Negócios e no Diário Económico. Este foi um hábito que ganhei de forma a tentar passar a parte da manhã sem grandes sobressaltos, pelo menos, até à hora da almoço: depois da reabertura dos mercados norte-americanos. Depois, durante o dia, lá vou dando uma espreitadela nas cotações das empresas que procuro escolher cuidadosamente para investir, e que vou vendendo ou comprando sempre que julgo estar perante uma oportunidade de facturar alguma coisa. Porém, hoje, lá para o meio da manhã, estava um bocado distraído [com o trabalho] quando ouvi na Antena1 a notícia sobre a OPA lançada pelo inenarrável Joe Berardo. Como estava distraído, e como não estou habituado a ver investidores com uma vontade louca de perder dinheiro, confundi “OPA” com “OTA”, e pensei que a notícia tinha a ver com o financiamento do Joe Berardo ao estudo do aeroporto em Alcochete. Não percebi muito bem o que é que o Ésse Éle Bê tinha a ver com o assunto, mas como o Luís Filipe Vieira gosta de se meter em tudo o que é confusões… não estranhei muito.

Poucos minutos depois um colega que partilha comigo o interesse por esta coisa das acções enviou-me um e-mail com um link para a notícia do Jornal de Negócios que se referia à tal OPA do Joe Berardo. Fui de imediato ver a cotação das acções do Ésse Éle Bê e constatei que a forte especulação as estava a fazer subir vertiginosamente – vi logo ali uma oportunidade única de ganhar facilmente uns valentes cobres em poucas horas.

Fiquei bastante stressado e tive de fazer de imediato um intervalo para beber um cafezinho, esfumaçar um cigarro, e ir meditar melhor sobre o assunto. É que a minha religião não me permite comprar acções do Ésse Éle Bê – nem nada que se pareça. Para entenderem melhor o que eu quero dizer posso confessar que só por terem patrocinado o Ésse Éle Bê num passado remoto, ainda hoje sou incapaz de comprar ou consumir qualquer artigo da Parmalat, pôr combustível numa bomba da Shell, ou comprar qualquer artigo no MediaMarket. E só continuo a beber Coca-Cola porque [para além de ser viciado] a marca também patrocina o Sporting.

Estive prestes a cometer uma loucura mas a verdade é que segui à risca o primeiro mandamento da minha religião: «não ajudarás de nenhuma forma o Ésse Éle Bê». Posso até ter terminado o dia com menos uns valentes cobres na carteira, mas não estou nada arrependido. Pelo menos posso continuar a viver em paz com a minha consciência.

PS. Quem comprou acções do Ésse Éle Bê e não aproveitou para as vender hoje, se tem amor ao dinheirinho, é bom que se desfaça delas na segunda-feira, e bem cedinho.

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DREN e a noção de delação

Em relação a todas as interpretações que possamos fazer sobre a actuação da directora da DREN algo me parece claro:
punir alguém por um sms enviado por interposta pessoa é um erro crasso.
Principalmente quando tal não é desmentido e é, aliás, menorizado.
A delação, ou em termos mais corriqueiros as "queixinhas", passam para a opinião pública como comportamentos indesejáveis, apesar da directora da DREN esclarecer que está a agitar muitos interesses.
Agora vejamos a delação com o seguinte exemplo:
A escola tem a seguinte praxe:
Os alunos mais velhos, do sexo masculino, atiram os alunos mais novos do mesmo sexo a um determinado poste, pois na escola institui-se que esse é um comportamento instituído há alguns anos e os mais velhos deverão testar os mais novos através desta prática.
Tal comportamento não deverá ser do conhecimento do Conselho Executivo da Escola, uma vez que revela perigosidade, a todos os níveis, para o(s) aluno(s) alvo(s) da prática?
E o aluno que faz "queixa" não estará a enveredar pela prática de delação, no sentido de denúncia?
A diferença óbvia entre uma prática e outra é a questão dos direitos humanos, ninguém tem direito a agredir ninguém através de uma prática irracional de testar os limites físicos e psicológicos do outro.
Perguntarão: mas então agredir verbalmente uma figura pública, por exemplo, não será, também, uma forma de agressão psicológica?
Parece-me que a liberdade de expressão envereda, por vezes, por falta de bom senso, mas também sabemos que o bom senso é uma palavra demasiado gasta e subjectiva para a maior parte das pessoas.

Nota final: No outro dia ouvi alguém chamar ao rato do computador Cavaco Silva, tal expressão, para mim, também demonstrou falta de respeito para com o chefe de estado, mas eu sei que se verbalizasse isto, com a pessoa em causa, lá vinha a liberdade de expressão à baila e o bom senso, algo que me parece demasiado subjectivo para poder ser discutido com objectividade.

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quinta-feira, junho 14, 2007

Lux

Lux? perguntaste tu. Lux, como o sabonete? Era dia de semana, azul e luminoso, e passeávamos pela cidade de meu coração, a cidade que amo acima de todas, porque lá fala-se a minha língua e a minha língua é a minha Pátria, como Pessoa afirmou. O caos é ele próprio uma forma de vida e cidade alguma consegue mimar-nos como Lisboa, com a luz de Lisboa. A primeira luz que vi, a primeira cor do mundo foi a cor de Lisboa e a última cor que verei, será a de Lisboa também?
Cidade branca, cidade cinzenta, cidade azul, pintada de cores e humores, caprichosa e voluntariosa, paciente e terna. Como línguas, as ruas alongam-se até ao rio. Há carros, sempre carros e camionetas e comboios e eléctricos. Outrora amarelos, mas ainda da Carris. Há pobres e ricos, há pretos e brancos, há louros e morenos, há mães e putas, há viúvas e órfãos. Há pedintes, nacionais e estrangeiros, anunciando o advento da multiculturalidade também nesta “triste forma de vida” e arrumadores, andrajosos e miseráveis, quase todos, convictos no desempenho da sua função e sempre sequiosos da recompensa, obtida mais por receio do que merecimento.
A vida flui calma no stress mediterrânico de quem tem muito que fazer, embora os horários mais não sejam do que ténues pontos de referência para quem quer ver as notícias das oito ou das dez ou as incontáveis telenovelas de gosto duvidoso, cujo efeito terapêutico provoca uma catarse, colectiva e individual, em domésticas e executivas, ecoando no ar como um sonoro orgasmo simultâneo.
Assim é a minha cidade. Magnífica, como só ela sabe ser, e todos os dias ela cresce, a cidade, e se deixa descobrir, brindando-nos com as inúmeras vistas e as perspectivas sempre renovadas, ângulos novos reveladores da alma da urbe. Eternamente, o Miradouro de Santa Luzia. Sempre Alfama, sempre o Castelo e a Sé, mas também as zonas ribeirinhas onde paira amiúde a maresia, a maresia do rio. Cheira-me repentinamente a sardinha assada e a manjerico de Santo António de Lisboa, e a cidade torna-se ainda mais colorida, mais feérica. Agrada-me a Lisboa dos roteiros turísticos, a Lisboa brejeira e varina, de braço dado com a mais sofisticada e elegante, e esqueço os subúrbios quase imorais de tanta fealdade e, agora que se me foi o cheiro da sardinha, regressa o fumo semi-opaco das castanhas assadas e sim, agora sim, agora ecoam os versos de Cesário Verde que, também ele, cantou Lisboa, o Tejo e a maresia, e vejo o bulício espesso de que falava Nas nossas ruas, ao anoitecer...
A cidade, a mãe, a matriz. Lado a lado íamos as duas. As duas admirando a cidade, as duas sentindo a cidade onde me puseste no mundo, acredito que não por acaso, e aguardaste ansiosamente que os mínimos olhos de recém-nascida se abrissem, para o mundo, para ti, minha mãe, para a cidade também, na esperança que fossem ínfimas esmeraldas ou pequenitos cristais, cor de mar caribenho, ou talvez duas gotículas do Tejo, indefinidas entre o azul e o verde, como o mar, como o Tejo. Mas não, minha mãe, eram negros os olhos, como duas azeitonas, contas tu e então sorrimos enternecidas e somos verdadeiramente mãe e filha.
Há muita plenitude em ser mãe, muita grandiosidade também, dizem, que de ser mãe nada entendo. Ser filha pode ser pleno e grandioso também. Quando almoças comigo na cidade, quebrando a solidão de horas a fio que mais parecem ser dias, dias cinzentos e opacos, dias sem sol, nem azul, ou quando esperas pacientemente que, empolgada, passe revista a todas as camisas, camisolas, tops e t-shirts, existentes nas lojas de roupa e me fazes notar, como só as mães sabem, que aquela blusa branca, aquela que me parece tão gira e diferente, é exactamente igual a todas as outras que tenho, também isso é belo e igualmente pleno. Este dia, em que ambas comungávamos a urbe encantada sob o brilho dourado do sol do meio-dia, não era dia triste, era grande e perfeito, como o sol de Lisboa, e quando te mostrei um dos locais badalados da noite na cidade e me questionaste algo incrédula a sua graça Lux? Lux como o sabonete? nunca foi tão inebriante nem tão belo o cheiro a sabonete.


foto: minha

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Balanço de competências III

Uma forma um tanto ou quanto mais competente de manifestar discordância sobre isto lido aqui, teria sido manifestar discordância sobre, sem envolver juízos de valor. A forma como é abordada a questão poderá gerar interpretações do género: agredir uma figura conhecida, uma forma perniciosa de demonstrar um dos pecados capitais mais pesticidas da vida real e virtual: a inveja.
Ora uma das competências desejáveis para um blogger deverá ser:
- capacidade de manifestar discordância de uma forma objectiva, factual e racional.
Assim deveria escrever-se qualquer coisa como: "achincalhar" publicamente alguém, para mim, equivale a falta de educação e respeito pelo próximo.
Mas pergunta mpr com muita pertinência:
"O humor é então falta de educação?" - mpr pretende sugerir que o humor não deve ter entraves, afirmação com a qual eu concordo em teoria.
Outra das leituras possíveis ao que se escreveu, complementando a expressão anterior:
- um blogger para além de dever saber manifestar discordância de uma forma objectiva, factual e racional, deverá argumentar de uma forma clara, isto é explicando de uma forma objectiva as razões que o levam a tal conclusão.
É óbvio que estou a falar de bloggers que manifestam preocupação com o assunto, uma vez que me parece muito interessante, a todos os níveis, algumas competências que o "blogar" desenvolve:
- comunicação escrita;
- auto-avaliação;
- aprender a lidar com as emoções - "A expressão da emoção é fácil – o complicado é saber expressá-la de uma forma equilibrada" (Manual de Balanço de Competências, Ana Silva);
- compreender que a forma de resolver más disposições, não passa decididamente por desancar no próximo, aqui não resisto à frase de Aristóteles: "Qualquer um pode zangar-se – isso é fácil. Mas zangar-se com a pessoa certa, na justa medida, no momento certo, pela razão certa e da maneira certa – isso não é fácil."
Assim, conclui-se, muito claramente, que a forma de argumentação utilizada foi claramente deficiente, porque:
- permite interpretações erradas sobre o que se pretendeu dizer;
- revela índices elevados de argumentação emocional, indesejáveis para quem pretende expor algo com clareza, objectividade e concisão.
Então o que deveria ter sido dito?
Tenho uma certa limitação pessoal em achar piada ao "achincalhamento" em público de alguém que, à partida, não terá possibilidade de se defender, independentemente da pessoa em causa. As pessoas, de uma maneira geral, deverão ou não ser dignas de respeito e gentileza? Poderá perguntar-se:
- então um assassino, um pedófilo, um psicopata, também é digno de?
Ponto fulcral e razão pela qual o ser humano é um ser sempre em vias de. Esse tipo de crença, para mim, é uma "falsa" crença, pois este tipo particular de ser humano não deveria ser digno de.
Porque é uma "falsa" crença?
Colocando-me no papel de Paris Hilton, imagino-me a ser alvo de, manifestando uma incapacidade notória em perceber que o humor é uma forma de dizer algumas verdades de uma forma frontal. Tal em termos pessoais poderá até ser bastante interessante?
Engulo em seco e em nome da honestidade intelectual não dou uma cambalhota argumentativa, manifestando agora concordância com, apesar de considerar interessante a capacidade que o homem tem de se auto-avaliar. Perante muitas das nossas emoções, que geram afirmações, concluo que no campo das relações humanas o caminho a percorrer ainda é longo.

Nota final:
Os "posts" Balanço de Competências I,II e III, não fizeram parte de nenhuma estratégia. O primeiro sugeriu os posteriores de uma forma espontânea, ao mesmo tempo que se pretendeu abordar, de uma certa forma, o tema em causa.

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