terça-feira, junho 19, 2007

Um cordeiro na pele de lobo

A política portuguesa, nos últimos 30 anos, revelou figuras muito curiosas:
- Os capitães de Abril - existem contestações óbvias ao comportamento dos militares do 25 de Abril, contudo é inegável a leitura positiva da sua actuação: a devolução da liberdade à sociedade portuguesa, libertando-a do cinzentismo do Salazarismo e do pensamento único. Contudo a determinada altura tornou-se evidente a perigosidade do seu estreitamento ideológico e as consequências drásticas a que tal poderia ter conduzido;
- Ramalho Eanes - é um militar emblemático e com um valor muito esclarecido acerca do que é a liberdade. É uma das personalidades políticas portuguesas a quem devemos a permanência em liberdade, a sua actuação numa determinada época foi crucial.
- Álvaro Cunhal - Um político sério, autoritário, inteligente, com uma grande capacidade de manipulação, cuja batalha, se tivesse sido ganha, ter-nos-ia conduzido a outra versão do pensamento único, a expressão eufemística: ditadura do proletariado;
- Mário Soares - a sua importância histórica incontornável, a sua empatia com os media, e o consequente endeusamento. Não há ninguém com um poder comunicacional tão histriónico como o ex-presidente da república. Ele consegue dizer as maiores barbaridades e pôr a classe jornalística a salivar de uma forma contemporânea o que me parece extraordinariamente cómico e louvável.
- Sá Carneiro - era um político muito sério e com ideias muito próprias para um determinado Portugal. Sá Carneiro, tal como Cavaco, também conseguiu fintar, muito sub-repticiamente, a classe dos comentadores políticos. Demonstrou à opinião pública que a sua seriedade era extraordinariamente humana, para alguém que até ali tinha veiculado uma imagem fundamentalmente autoritária, constituiu uma revelação.
- Freitas do Amaral - Pelo que eu conheço do seu percurso político, parece-me que estamos perante alguém com valores muito cristãos e humanos. A sua única ideologia é a interiorização da necessidade da tolerância para lidarmos construtivamente uns com os outros. A sua tolerância zero à intolerância é simbolizada, recentemente, através das suas afirmações sobre as caricaturas de Maomé.
- Francisco Louçã - é um político extremamente hábil, inteligente e com uma grande capacidade de manipulação dos media.
- Cavaco Silva - interiorizou a necessidade de uma postura muito séria na política. Está na política com o ideal de serviço público, tendo na mira o sentimento patriótico, tão incomodativo para determinadas ideologias.
- José Sócrates - é um político muito determinado, teimoso e que sabe o que quer. Leu a necessidade de uma postura autoritária e séria na política, contudo comete um erro de avaliação: para se chegar à opinião pública é preciso, acima de tudo, fazer de conta. Sócrates precisa de interiorizar a seriedade como comportamento e a humanidade como atitude. Se tivesse encarado os "problemas" da licenciatura como uma oportunidade de se humanizar, teria calado a oposição, agora está a braços com as graçolas inerentes ao caso e o ruído de fundo que se traduz na seguinte expressão: é nos momentos difíceis que damos a conhecer o nosso carácter.
- Paulo Portas - a interiorização errada de que seriedade (comportamento) se traduz através do populismo (atitude). Se tal atitude resulta nas autarquias, pois o povo continua a fazer o seguinte raciocínio: proximidade, simpatia do presidente = seriedade, num líder político é mortal: pois só em altura de eleições é que o líder político se relaciona de uma forma mais directa com a população, daí que se torne, muito facilmente, alvo de chacota.

Concluo então o seguinte: o fundamental para um político é a capacidade de transmitir um comportamento de seriedade e autoritarismo através de uma certa humanidade, mas, tudo isto a favor de uma única ideologia: o engrandecimento de Portugal.

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6 Comments:

Blogger james stuart said...

Estou realmente muito satisfeito por verificar que alguém (neste caso NancyB)tem a capacidade analítica que me parece imparcial (e apolítica) sobre as "figuras" chave da política portuguesa do período após o ano de 1974. Estou plenamente de acordo com os parâmetros e as biografias (sumários), apenas uma pequena discordância (ou vá lá, somente uma diferente visão), que é pouco rigoroso afirmar que os militares "devolveram a liberdade à sociedade portuguesa" pelo seguinte: Só se pode devolver uma coisa que foi retirada. Ora bem, antes da ditadura de Salazar existia uma ditadura militar, e antes disso uma tal confusão e desordem precedente a uma monarquia.
Sobre isto escrevi um aartigo no meu Blogue (exactamente no dia 25 de Abril de 2007).
Porém a clareza de toda a sua análise é louvável... apreciei mesmo... mas é mormente estranho que citando Louçã, Portas e Freitas do Amaral... não haja referências a Guterres (caramba, o homem representou dois governos constitucionais) e talvez ainda outros "nomes" de relevo.
Os meus parabéns por esta "tanta claridade"

terça-feira, junho 19, 2007 11:49:00 da manhã  
Blogger james stuart said...

Cara amiga Nancy B ....!!!!!
Tome atenção à imagem reproduzida.
A imagem apresentada não é a bandeira da República Portuguesa, sugiro que a substitua.
As proporções entre o verde e o vermelho são da 2/5 e 3/5, mas o grave da imagem é o facto da posição dos escudetes não ser essa!!!
Também as cores não estão correctas, o vermelho e o verde não são tão fortes... mas isso já é comum encontrar até "â porta" dos Ministérios...

Isto "chamou-me" à atenção apenas porque recentemente editei um artigo no meu blogue sobre o assunto (com a imagem da bandeira republicana) e após dei conta que a maioria dos "bloguistas" reproduz imagens que não são de todo correctas.

Ademais, a reprodução e apresentação pública de imagens dos símbolos nacionais diferentes do regulamentado são puníveis por lei

terça-feira, junho 19, 2007 1:39:00 da tarde  
Blogger NancyB said...

Caro James,

Agradeço a sua contribuição para a análise da questão. Concordo com o seu rigor explanativo, qto à bandeira, confesso q não me apercebi da diferença. Faltou Guterres, entre outros, efectivamente tem razão.

terça-feira, junho 19, 2007 2:22:00 da tarde  
Blogger Unknown said...

«Sócrates precisa de interiorizar a seriedade como comportamento e a humanidade como atitude. Se tivesse encarado os "problemas" da licenciatura como uma oportunidade de se humanizar, teria calado a oposição, agora está a braços com as graçolas inerentes ao caso e o ruído de fundo que se traduz na seguinte expressão: é nos momentos difíceis que damos a conhecer o nosso carácter.»

Eu percebo o que tu estás a dizer, mas acho que no fundo não posso concordar. Porque os media (por razões que em parte são boas) deitaram-se ao assunto como leões. Era inevitável, como a era do respeitinho já acabou, quanto mais lama houvesse, mais lama ia ser escarrapachada nas primeiras páginas. Assim sendo Sócrates (no meu entender) tinha mesmo que jogar à defesa.

No fundo nos dias de hoje a jogada do "só sei que nada sei" não é muito sensata.

terça-feira, junho 19, 2007 10:01:00 da tarde  
Blogger NancyB said...

Luis,
Falo no Zé, aquele que anda aí pelas ruas e vê tv. Se esse Zé tivesse visto o primeiro na Tv a falar sobre o assunto de uma maneira humana, interiorizaria a humanidade do primeiro ministro. Os jornais? Vão para o lixo!

quarta-feira, junho 20, 2007 10:14:00 da manhã  
Blogger Unknown said...

Por isso é que eu disse que percebi o que tu tinhas dito. E conforme dizes há de facto certos jornais que é suposto irem para o lixo.

quarta-feira, junho 20, 2007 12:09:00 da tarde  

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