sexta-feira, setembro 18, 2009

A aldeia global, o processo RVCC e qwerty2001

Por detrás desta guerra estarão certamente outras guerrilhas.
A destruição do carácter é, afinal, uma estratégia social de longos séculos.
Um dos motivos que levaram ao afastamento das pessoas dos locais mais pequenos é, também, a asfixia social e privada do indivíduo perante os excessos sociais do colectivo. Sartre concentrou esse mal-estar (e outros) numa frase bastante feliz "O inferno são os outros".
O linguarejar (in)consequente sobre a opção de vida de cada um atinge, nesses locais, proporções surrealistas e bastante esotéricas. Sobreviver ao inferno daria, nalguns casos, histórias de vida propícias a um reconhecimento válido e certificado de competências de sobrevivência, com júri e tudo.
O linguarejar da aldeia global é um tanto ou nada semelhante à aldeia bucólica de Alberto Caeiro, só que em vez do primado do saber de experiências feito e de uma propensa harmonia entre homem e natureza, impera o primado do saber de experiências (re)criadas e uma conivência algo (ir)regular.

Na aldeia global as profissões e empresas reconhecidas, validadas e certificadas são as agências de comunicação, os seus assessores, os seus clientes; os grupos detentores dos órgãos de comunicação social, os seus jornalistas e os seus clientes; o Estado, os políticos e os seus clientes; a Universidade, os académicos e os seus clientes; e tudo o resto, algum desse resto somos nós, o motivo pelo qual se dá tudo isto.
Parece que aquele pessoal anda todo a "fazer a caminha uns aos outros" para terem acesso aos consumidores dos seus produtos, NÓS. Sinceramente acho tudo isto muito pouco proveitoso, deveríamos exigir algo em troca.

Algo do género, sim, senhor, eu compro a sua guerrilha, mas em troca quero que diga aí no seu jornal qu'a Fernanda da Burra anda a "cagar" as ruas de qwerty2001 com bosta de macho.
Na aldeia bucólica toda a gente sabe qu'isto é mentira, a Fernanda da Burra tem um daqueles carros chamados papa reformas e provoca alguns acidentes, mas a primeira história é muito mais campestre.

Numa aldeia global o kit de sobrevivência deverá possuir ferramentas idênticas ao da aldeia de Alberto Caeiro.
As histórias de vida serão mais ou menos recreativas, sociais, políticas e/ou económicas, mas o processo de validação será um tanto ou nada semelhante.

"Saúdo todos os que me lerem,
Tirando-lhes o chapéu largo
Quando me vêem à minha porta
Mal a diligência levanta no cimo do outeiro.
Saúdo-os e desejo-lhes sol,
E chuva, quando a chuva é precisa,
E que as suas casas tenham
Ao pé duma janela aberta
Uma cadeira predileta
Onde se sentem, lendo os meus versos.
E ao lerem os meus versos pensem
Que sou qualquer cousa natural —
Por exemplo, a árvore antiga
À sombra da qual quando crianças
Se sentavam com um baque, cansados de brincar,
E limpavam o suor da testa quente
Com a manga do bibe riscado."

Alberto Caeiro,
Fonte

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