segunda-feira, abril 30, 2007

Claridade (e escuridão)

Neste Mês da Poesia, que está a terminar, tenho-me lembrado muito da minha professora de Português do ciclo. Todas as semanas, ou, pelo menos, semana sim, semana não, parte do sumário era «Produção de um texto escrito». E isto consistia em, a partir de um tema, de uma forma ou de uma leitura construirmos nós um pequeno texto, sendo que o privilegiado era, de longe, o texto poético. Fazíamos pequenas quadras, ou variações de uma estrutura; às vezes saíam coisas interessantes, outras vezes nem por isso; às vezes dava gosto, outras vezes, confesso, enfado. Quando se conseguia, de facto, escrever alguma coisinha de jeito, dava gosto; mas havia alturas em que passava os 10 minutos a juntar duas palavras – e mal! Admiro a criatividade e a perseverança do escritor. Muito raramente escrevo um texto à primeira e o escrever e voltar a escrever sem se chegar a lugar algum consegue ser bastante frustrante... Aqueles momentos de produção poética no 5º e 6º ano foram bons exercícios – que eventualmente até tinham bons resultados...

Lembro-me, uma vez, de termos feito, um poema a partir de uma leitura, procurando como que explorar-lhe o outro lado. Lembro-me que o meu falava do escuro e de uma rapariga num cesto de verga... Busco os cadernos, à procura... Achei! «Escuridão». Falta agora achar o original, que não sei de quem é, mas lembro-me que fala do branco, da luz e de uma rapariga a estender roupa... Busco o manual do 6º.ano... Achei! «Claridade» de Miguel Torga. E, num momento de narcisismo, aqui fica mais um (dois!) poema que me diz alguma coisa, de alguma forma, a fechar a minha contribuição poética do Mês.


Claridade

Clareou
Vieram pombas e sol,
e, de mistura com Sonho,
pouso tudo num telhado...
(Eu, destas grades, a ver,
desconfiado).

Depois, uma rapariga loira,
(era loira)
num mirante,
estendeu roupa num cordel:
Roupa branca, remendada,
que se via
que era de gente lavada,
e só por isso aquecia...

E não foi preciso mais:
Logo a alma
clareou por sua vez.
Logo o coração parado
bateu a grande pancada
da vida com sol e pombas
e roupa branca, lavada.

Miguel Torga
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Escuridão

Escureceu
Passaram bichos ao luar
com vontade de sonhar
que nos seus ninhos foram pousar
(E eu do meu quarto
a olhar).

Depois,
uma rapariga negra
(era negra como a noite)
deitou-se num cesto de verga.
Pobre rapariga, não tem casa,
não tem lar
(e eu do meu quarto
a olhar).

A minha alma ficou preta
(preta como carvão)
ao ver a rapariga negra
a dormir quase no chão...
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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

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quarta-feira, outubro 24, 2007 12:25:00 da tarde  

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