Dos Gardenias
Não mais esquecerei aqueles olhos que me cantaram.
Havana é um sítio mágico com um encanto único. Será a miscigenação das gentes? Serão os sorrisos incomparáveis que deixam na alma a fugaz sensação de ser, por um instante, amado? A fusão da decadência com a nostalgia de tempos de outrora? Podíamos cá ficar disseste, e concordei Sim, era capaz de cá ficar. Talvez aquele calor. Talvez a vendedora do colar de semillas rubras que, ao segundo dia, me chamou, como poucos me chamam, Hola, amiga!!! Talvez o empregado do hotel com sorriso aberto e pele de chocolate de leite Una piñita? Talvez a displicência das mulheres carnudas, ao exibirem os corpos voluptuosos sem culpa. Talvez o son. Talvez.
E continuámos sonhando Abríamos cá um paladar, tu cozinhavas e eu servia à mesa. Imaginava-me por trás dos tachos e panelas, mesclando sabores lusos com leve travo cubano e não desgostava do sonho, exactamente porque era um sonho, e o que me agradava no sonho, muito menos ambicioso do que outros que tivera, era a ausência de ostentação, esse aparente despojamento, a humildade no querer. Vínhamos para cá continuávamos Já viste este calor? E as pessoas são tão simpáticas... pois era e depois com o paladar... Mas tem que ser uma empresa familiar. Não pode haver empregados e também só se podem sentar doze pessoas. E o sonho continuava conversando.
E assim ficaria. Sem títulos. Apenas um letreirito, sem glamour nem minimalismos impostores, apenas um letreirito na porta anunciando PALADAR, acrescido de um outro nome mais sugestivo, por exemplo, DOS GARDENIAS, em homenagem aos olhos que me cantaram essa mesma canção na Plaza de Armas, um dia após o meu aniversário, num tórrido dia de sol habanero, e que recebi na alma como um presente para a efeméride, o mais original dos presentes e dos mais sentidos da minha vida.
E os soneros acompanharam-me pela praça, entoando Dos gardenias para tí... Con ellas quiero decir: te quiero, te adoro, mi vida... As pernas tremendo, os olhos a humedecerem-se teimosos ao ouvir a melodia que outrora num filme, também belo esse filme, me proporcionou um momento sem igual e, ao encontrar-me então sozinha e solitária na sala de cinema, assaltou-me a vontade compulsiva de cutucar com o indicador no ombro do espectador do lado, abeirar-me dele e partilhar esfuziante Deixe-me contar-lhe isto: é que eu vi esta mulher em Havana, ao vivo, no Tropicana... esta mesmo, esta que eles diziam que era a Amália Rodrigues lá do sítio. Pode ser triste a solidão que nos impele a partilhar com estranhos momentos belos da nossa história ou pode ser bela, também, apenas a necessidade de partilhar plenitudes.
E a música continuava, melhor do que qualquer disco, mais sentida que qualquer fado, mais romântica que qualquer jantar à luz de velas no paraíso maldivo. Não se lhes ouvia a voz, ouvia-se-lhes a alma. A praça encheu-se ainda mais de mais luz, ainda mais intensa e verdejante, a ceiba e o Templete e mais cor, talvez da guayabera turquesa que um dos cantantes envergava, e transbordei de sentir num daqueles momentos sem explicação e que nos faz pensar que valeu a pena ter vivido. Sim, assim vale a pena. Assim valeu a pena.
E ele tirou o chapéu e recolheu-o junto ao peito entoando sempre Dos gardenias para tí... e também eu lhe tirei, metaforicamente, o meu chapéu. Eram para mim, as gardénias... Os olhos cantavam, olhos cristalinos de mar caribenho. Jamais esquecerei os olhos, os olhos que me cantaram.
Vínhamos para cá... e depois com o paladar e rematávamos Já viste que calor este, que noite esta... recomeçávamos a conversa após breves intervalos de silêncios cúmplices Imagina só PALADAR »DOS GARDENIAS«, e eu imaginava. Eu na cozinha a cheirar a hierbabuena e tu, nas mesas, delicado entre mojitos e tostones e os olhos a cantarem-me Dos gardenias para tí...
Havana é um sítio mágico com um encanto único. Será a miscigenação das gentes? Serão os sorrisos incomparáveis que deixam na alma a fugaz sensação de ser, por um instante, amado? A fusão da decadência com a nostalgia de tempos de outrora? Podíamos cá ficar disseste, e concordei Sim, era capaz de cá ficar. Talvez aquele calor. Talvez a vendedora do colar de semillas rubras que, ao segundo dia, me chamou, como poucos me chamam, Hola, amiga!!! Talvez o empregado do hotel com sorriso aberto e pele de chocolate de leite Una piñita? Talvez a displicência das mulheres carnudas, ao exibirem os corpos voluptuosos sem culpa. Talvez o son. Talvez.
E continuámos sonhando Abríamos cá um paladar, tu cozinhavas e eu servia à mesa. Imaginava-me por trás dos tachos e panelas, mesclando sabores lusos com leve travo cubano e não desgostava do sonho, exactamente porque era um sonho, e o que me agradava no sonho, muito menos ambicioso do que outros que tivera, era a ausência de ostentação, esse aparente despojamento, a humildade no querer. Vínhamos para cá continuávamos Já viste este calor? E as pessoas são tão simpáticas... pois era e depois com o paladar... Mas tem que ser uma empresa familiar. Não pode haver empregados e também só se podem sentar doze pessoas. E o sonho continuava conversando.
E assim ficaria. Sem títulos. Apenas um letreirito, sem glamour nem minimalismos impostores, apenas um letreirito na porta anunciando PALADAR, acrescido de um outro nome mais sugestivo, por exemplo, DOS GARDENIAS, em homenagem aos olhos que me cantaram essa mesma canção na Plaza de Armas, um dia após o meu aniversário, num tórrido dia de sol habanero, e que recebi na alma como um presente para a efeméride, o mais original dos presentes e dos mais sentidos da minha vida.
E os soneros acompanharam-me pela praça, entoando Dos gardenias para tí... Con ellas quiero decir: te quiero, te adoro, mi vida... As pernas tremendo, os olhos a humedecerem-se teimosos ao ouvir a melodia que outrora num filme, também belo esse filme, me proporcionou um momento sem igual e, ao encontrar-me então sozinha e solitária na sala de cinema, assaltou-me a vontade compulsiva de cutucar com o indicador no ombro do espectador do lado, abeirar-me dele e partilhar esfuziante Deixe-me contar-lhe isto: é que eu vi esta mulher em Havana, ao vivo, no Tropicana... esta mesmo, esta que eles diziam que era a Amália Rodrigues lá do sítio. Pode ser triste a solidão que nos impele a partilhar com estranhos momentos belos da nossa história ou pode ser bela, também, apenas a necessidade de partilhar plenitudes.
E a música continuava, melhor do que qualquer disco, mais sentida que qualquer fado, mais romântica que qualquer jantar à luz de velas no paraíso maldivo. Não se lhes ouvia a voz, ouvia-se-lhes a alma. A praça encheu-se ainda mais de mais luz, ainda mais intensa e verdejante, a ceiba e o Templete e mais cor, talvez da guayabera turquesa que um dos cantantes envergava, e transbordei de sentir num daqueles momentos sem explicação e que nos faz pensar que valeu a pena ter vivido. Sim, assim vale a pena. Assim valeu a pena.
E ele tirou o chapéu e recolheu-o junto ao peito entoando sempre Dos gardenias para tí... e também eu lhe tirei, metaforicamente, o meu chapéu. Eram para mim, as gardénias... Os olhos cantavam, olhos cristalinos de mar caribenho. Jamais esquecerei os olhos, os olhos que me cantaram.
Vínhamos para cá... e depois com o paladar e rematávamos Já viste que calor este, que noite esta... recomeçávamos a conversa após breves intervalos de silêncios cúmplices Imagina só PALADAR »DOS GARDENIAS«, e eu imaginava. Eu na cozinha a cheirar a hierbabuena e tu, nas mesas, delicado entre mojitos e tostones e os olhos a cantarem-me Dos gardenias para tí...
Etiquetas: Festa da Música
4 Comments:
Peço licença para recomendar Dos Gardenias cantada por Antonio Machin.
Obrigada pela sugestão. Por razões técnicas não foi possível colocá-laa aqui.
Dos gardenias ... uma escolha perfeita! :))
Chan chan também é uma das minhas preferidas e o Buena Vista um filme que revejo sem me cansar.
Bjs
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