sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Birds Eye View

Concedo que a imagem que tenho da sociedade portuguesa possa estar um bocado enviesada devido ao facto de não viver o dia-a-dia do país. No entanto este meu distanciamento físico também pode servir de justificacao para a minha pretensão de conseguir ter uma visão tipo birds eye da coisa. Por isso, e mesmo caindo no risco de parecer injusto ou desajustado, aqui vai a minha análise a la Pedro Arroja (com as devidas distâncias, naturalmente)

Também eu não quero dar demasiada importância aos casos dos livros de Braga e do autocolante de Torres Vedras. Como casos isolados não passam realmente de episódios anedóticos ou petits faits-divers.

Mas também acho que não há muita diferença entre estes dois casos e, por exemplo, a forma escolhida pelos professores para se manifestarem contra as mudanças propostas, ou o facto de os militares acharem normal andar a "passear" fardados pela avenida, ou de alguns dos mais altos responsáveis da nossa justiça e investigação criminal não resistirem a tornar-se vedetas dos media, ou muitas outras situações do mesmo género.

Todas elas revelam essencialmente uma grande falta de bom-senso. E esta falta de bom-senso é o efeito imediato da perda de um quadro de referências sólido, sem o qual qualquer sociedade terá uma tendência natural para se desarticular.

A nossa elite, responsável pela manutenção deste quadro de referências, deixou-se corromper pelo novo-riquismo e pelo egoísmo individualista e dissociou-se desta sua função essencial. Mais, aproveitou-se mesmo da sua situação privilegiada para benefício próprio e cavou um fosso ainda maior entre ela e o resto dos cidadãos.

A este factor acrescenta-se a situação de completo desinvestimento na cultura portuguesa. Desamparada e entregue a si própria, a nossa cultura tornou-se extremamente permeável a influências exteriores e descaracterizou-se, contribuindo assim para a perda de identidade colectiva.

As cerejas no topo do bolo são os sucessivos governos que, muito preocupados em discutir e mascarar indicadores para ficarem bem nas sondagens e nas reuniões de Bruxelas, deixaram de olhar para baixo e nem se apercebem que a população não está com eles e já nem reage aos seus estímulos por melhores ou mais bem tencionados que sejam.

É claro que de tudo isto não vem grande mal ao mundo. Portugal é e vai continuar a ser um lugar aprazível para se viver. Uns vão continuar a ter as suas casas, os seus carros, as suas férias no Brasil, …enquanto outros esperam pachorrentamente pela sua vez de aceder a este Olimpo do consumismo. As elites, essas passam a definir-se pelo tamanho da conta bancária ou pelo número de aparições na Caras; e os valores que veiculam passam somente a ser….diferentes.

A única coisa que esta desarticulação traz é que o país deixa de funcionar como um todo e torna-se somente num grupo de pessoas que partilha o mesmo espaço físico. Cada um traça o seu caminho de acordo com a sua personagem preferida das séries da Fox, e se alguém se mete com ele: leva!

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