quinta-feira, julho 19, 2007

Don´t try this at home

A verdade é que podem não saber quem foi Luís de Camões, ignorar por completo a existência de Fernando Pessoa ou do nosso Prémio Nobel da Literatura, desconhecer quem é o Presidente desta República das bananas sem bananas, é certo e sabido, porém, que o futebol é poderoso nestas coisas da imagem no exterior e, nos países islâmicos que visitei, ficou óbvio que os nossos embaixadores são mesmo os rapazes da bola. Bem me esforcei por arranhar um Saalam Aleikum, um Aleikum Saalam, um Chokran aqui e acolá mas sempre fui recebida com um Luís Figo, Rui Costa e outros tantos assim de rajada.
Era cedo, pelas cinco da madrugada talvez quando nos metemos no autocarro rumo a Marraquexe. A estrada entre Agadir e Marraquexe é estreita e com curvas, tem pouca visibilidade e a condução em Marrocos, pelo que me foi dado a observar não é muito mais cuidada da que se verifica por essas estradas lusas, um susto, portanto. Tudo isto pela manhã não se apresenta como o melhor dos cenários, até porque o meu humor matinal é mais eficaz que repelente e irascível que nem Marte em dias maus. Marraquexe, contudo, merecia o sacríficio. A cidade vermelha, com a Djem El Fnaa pululante de encantadores de serpentes, contadores de histórias e malabaristas com macacos, o sol a pôr-se na praça e a praça a levantar-se em luz e movimento, os mistérios que encerra a Medina e o perfume do chá de menta cruzados com as palavras de Elias Canetti em As Vozes de Marraquexe constituíam a motivação para esta via quase sacrificial através do Atlas.
Algures no meio do caminho fez-se uma paragem e eu fiquei, como convém nestas alturas, entregue a mim própria - eficaz, o repelente,- enquanto o meu companheiro de trilho fumava o seu cigarro descansado. Neste périplo, e enquanto destilava o humor canídeo na manhã tépida, entrei numa loja de souvenirs, vazia àquela hora. O empregado dirigiu-se a mim, perguntou-me a nacionalidade e, perante a mesma, chutou sem hesitar FIGO e eu rematei-lhe sem qualquer finta que não gostava do Figo, que era um pesetero. O homem calou-se, como um guarda-redes impotente perante um golo na sua baliza e deixou-me em paz zigazeando entre as estatuetas de alabastro e outras quinquilharias, sem sequer arriscar um regateio para aquecer as turbinas do negócio.
Quando regressei ao autocarro, relatei a história. Podia lá ser, andar a dizer mal do nosso felpudo mais famoso em terras mouras, que isto e mais que aquilo. Há assuntos que um homem e uma mulher não devem discutir. O Figo é um deles cá por casa e, a caminho de Marraquexe pelas sete da madrugada, assunto tabu.

foto: minha

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