eu acho graça à praxe!
[...]
P`ra entrar na universidade
é preciso
prender o humor
na gaiola do riso
ter médias altas
hi-hon, ão-ão
zurrar, ladrar
lamber de quatro o chão
[...]
Chamar-se a si mesmo
besta anormal
dá sempre atenuante ao tribunal
é formativo
p`ró estudante
que não quer ser popriamente
um ingnorante
Empurrar fósforos com o nariz
tirar à estupidez a bissectriz
eis causas nobres
estruturantes
eis tradição
sem ser o que era dantes
[...]
Mas há quem ache
graça à praxe
É divertida (Hi-hon)
Lição de vida (Ão-ão)
Maçã com bicho
acho eu da praxe
É divertida (Mé-mé)
Lição de vida (Piu-piu)
Maçã com bicho
acho eu da praxe
(e haja quem ache)
Sérgio Godinho, “Maça com bicho” (2000)
Eu acho graça à praxe! Só porque a fruta tem bicho, não quer dizer que a deitemos logo fora; há que aproveitar as partes boas. O convívio, a união, a descoberta da faculdade e da cidade, o conhecimento da vida académica. Dir-me-ão que se poderia ter tudo isto sem “lamber de quatro o chão” nem entrar no campo da “besta anormal”. Certo! Mas comandar 100 pessoas em todas aquelas actividades exige alguma hierarquia – tem de ser! Não se podem ter 100 opiniões diferentes sobre o que fazer, quando até maioritariamente o conhecimento dessas 100 opiniões é muitas vezes nulo em relação a novos espaços, a uma nova cidade e a toda uma série de novos hábitos. Isto pode parecer um bocado ditatorial, mas não é, ou melhor, não tem de ser! Aquelas 100 opiniões têm voz própria em tudo o que achem que atente contra a sua pessoa. Primeiro, só está na praxe quem quer!!! – “e isto é verdade, não é só publicidade”. Depois, aqueles que lá estão não têm de se sujeitar a tudo. À partida, a praxe não é ofensiva, é um modo divertido de se ir conhecendo as pessoas e o meio. Mas a diversão é muito relativa e se, por algum motivo, alguém sentir que a brincadeira ultrapassa os limites do razoável, quer física, quer psicologicamente, não tem de ficar calado.
É certo que ninguém gosta de andar de quatro. Mas, se tivermos em conta a tal necessidade de hierarquia e o “espírito de manada” que se cria, não me parece que isso seja assim tão grande humilhação. Isto desde que o tempo e o piso não sejam descabidos e sendo certo que quem tiver problemas físicos impeditivos não é nunca – não pode ser! – obrigado a estar de quatro.
Quanto ao “chamar-se a si mesmo "besta anormal", qual é o problema?! Nunca se insultaram a vocês ou aos vossos amigos nestes termos?! É preciso saber dar o desconto ao que se diz, tendo em conta o contexto em que é dito.
“Empurrar fósforos com o nariz” – isso até é divertido! E contar degraus, ou encenar piadas, ou passear as ruas a gritar as músicas, ou... “tirar à estupidez a bissectriz” – isto literalmente até deve dar uma situação engraçada, puxa pela imaginação e criatividade dos caloiros.
Quanto ao ser “tradição sem ser o que era dantes”, digam-me primeiro o que é que era dantes...
A praxe não é uma “lição de vida” [nem deve ter tal pretensão], mas é “divertida” [ou , pelo menos, pode e deve sê-lo!]. O problema é que só vêm às notícias as coisas más. Acho bem que se noticiem essas coisas, até porque para chegerm aos media é porque são mesmo graves. Mas isso não é problema da praxe em si, é problema de uns quantos anormais que se acham no direito de praxar. Ou seja, não é problema do espírito é problema das pessoas – de algumas pessoas!
“Haja quem ache” que a praxe é “maçã com bicho”, mas haja também quem, reconhecendo que o bicho existe, esteja interessado em recuperar a fruta, não se limitando, simplesmente, a abandonar o pomar.
P`ra entrar na universidade
é preciso
prender o humor
na gaiola do riso
ter médias altas
hi-hon, ão-ão
zurrar, ladrar
lamber de quatro o chão
[...]
Chamar-se a si mesmo
besta anormal
dá sempre atenuante ao tribunal
é formativo
p`ró estudante
que não quer ser popriamente
um ingnorante
Empurrar fósforos com o nariz
tirar à estupidez a bissectriz
eis causas nobres
estruturantes
eis tradição
sem ser o que era dantes
[...]
Mas há quem ache
graça à praxe
É divertida (Hi-hon)
Lição de vida (Ão-ão)
Maçã com bicho
acho eu da praxe
É divertida (Mé-mé)
Lição de vida (Piu-piu)
Maçã com bicho
acho eu da praxe
(e haja quem ache)
Sérgio Godinho, “Maça com bicho” (2000)
Eu acho graça à praxe! Só porque a fruta tem bicho, não quer dizer que a deitemos logo fora; há que aproveitar as partes boas. O convívio, a união, a descoberta da faculdade e da cidade, o conhecimento da vida académica. Dir-me-ão que se poderia ter tudo isto sem “lamber de quatro o chão” nem entrar no campo da “besta anormal”. Certo! Mas comandar 100 pessoas em todas aquelas actividades exige alguma hierarquia – tem de ser! Não se podem ter 100 opiniões diferentes sobre o que fazer, quando até maioritariamente o conhecimento dessas 100 opiniões é muitas vezes nulo em relação a novos espaços, a uma nova cidade e a toda uma série de novos hábitos. Isto pode parecer um bocado ditatorial, mas não é, ou melhor, não tem de ser! Aquelas 100 opiniões têm voz própria em tudo o que achem que atente contra a sua pessoa. Primeiro, só está na praxe quem quer!!! – “e isto é verdade, não é só publicidade”. Depois, aqueles que lá estão não têm de se sujeitar a tudo. À partida, a praxe não é ofensiva, é um modo divertido de se ir conhecendo as pessoas e o meio. Mas a diversão é muito relativa e se, por algum motivo, alguém sentir que a brincadeira ultrapassa os limites do razoável, quer física, quer psicologicamente, não tem de ficar calado.
É certo que ninguém gosta de andar de quatro. Mas, se tivermos em conta a tal necessidade de hierarquia e o “espírito de manada” que se cria, não me parece que isso seja assim tão grande humilhação. Isto desde que o tempo e o piso não sejam descabidos e sendo certo que quem tiver problemas físicos impeditivos não é nunca – não pode ser! – obrigado a estar de quatro.
Quanto ao “chamar-se a si mesmo "besta anormal", qual é o problema?! Nunca se insultaram a vocês ou aos vossos amigos nestes termos?! É preciso saber dar o desconto ao que se diz, tendo em conta o contexto em que é dito.
“Empurrar fósforos com o nariz” – isso até é divertido! E contar degraus, ou encenar piadas, ou passear as ruas a gritar as músicas, ou... “tirar à estupidez a bissectriz” – isto literalmente até deve dar uma situação engraçada, puxa pela imaginação e criatividade dos caloiros.
Quanto ao ser “tradição sem ser o que era dantes”, digam-me primeiro o que é que era dantes...
A praxe não é uma “lição de vida” [nem deve ter tal pretensão], mas é “divertida” [ou , pelo menos, pode e deve sê-lo!]. O problema é que só vêm às notícias as coisas más. Acho bem que se noticiem essas coisas, até porque para chegerm aos media é porque são mesmo graves. Mas isso não é problema da praxe em si, é problema de uns quantos anormais que se acham no direito de praxar. Ou seja, não é problema do espírito é problema das pessoas – de algumas pessoas!
“Haja quem ache” que a praxe é “maçã com bicho”, mas haja também quem, reconhecendo que o bicho existe, esteja interessado em recuperar a fruta, não se limitando, simplesmente, a abandonar o pomar.
6 Comments:
nunca percebi o discurso contra à praxe. andei numa instituição em q a tradição académica é levada bastante a sério, mas eu nunca fui "obrigada" a ser praxada, e só os meus colegas que achavam piada é que andavam na vida de praxado. essas notícias q ciclicamente vagueiam pelos jornais acerca da coisa, sempre me fizeram, por isso, alguma confusão.
"Primeiro, só está na praxe quem quer!!! – “e isto é verdade, não é só publicidade”."
No teu caso até acredito que seja verdade, mas no caso de outras pessoas tenho sérias dúvidas ...
PRAXE É FENÓMENO IGUAL AO DAS SEITAS
A praxe é o presentismo: o nosso compromisso é com o presente e há aqui um aspecto de euforia libidinal. Há uma espécie de orgia festiva e funesta Solta-se o animal que o humano tem dentro. E tem algo de integração? Tem. Mas não é controlável. Neste tempo sem responsabilidade pelo estado do mundo, só pode haver manifestações corporativas. A nossa democracia atola-se num aborrecimento letal.
A praxe é uma forma de quebrar esse aborrecimento?
É. Diria que é um ritual de exorcismo. Olho para a praxe da mesma forma que olho para as seitas. É o mesmo fenómeno, só que noutro contexto social. Nos lugares das garagens, vemos agora igrejas com um funcionamento orgiástico. É a efervescência social. Na praxe, afugenta-se esses fantasmas do corpo colectivo, porque ninguém gosta de estar a morrer.
A orgia é em simultâneo funesta e fúnebre. Aquele não é o reino da normalidade. Não tem pés nem cabeça, mas é o nosso tempo que não tem pés nem cabeça, que não se compromete com nada.
É o salve-se quem puder.
caro anónimo,
eu acho q'anda um pouco pró baralhadote...
não, não anda baralhadote.
eu não acho piada nenhuma à praxe. mas lá está, como não fui obrigada a ir, não fui.
sinceramente, uma coisa confunde-me muito na praxe. é para integrar e dar a conhecer a faculdade aos novos alunos...então pessoas com 18 anos, com autonomia para trabalhar, estudar, eleger os dirigentes da nação...não têm capacidade de autonomia para se integrarem num novo grupo, conhecerem a faculdade, a nova cidade?
não tenho pena dos caloiros que andam por aí de rastos a serem "humilhados". no fundo, a pior humilhação é a que um indivíduo provoca a si mesmo.
dixit.
nancy:
É sempre bom saber de alguém que também não é radicalmente contra a praxe - sem que com isso tenha de ser adepta da coisa.
luis:
Obviamente, eu só posso falar pelo que conheço. Mas do mesmo modo também quem critica só pode criticar o que conhece!
anónimo:
"Neste tempo sem responsabilidade pelo estado do mundo"
" A nossa democracia atola-se num aborrecimento letal."
"é o nosso tempo que não tem pés nem cabeça, que não se compromete com nada."
"É o salve-se quem puder. "
Tem uma visão demasiado negativa do mundo em si, por isso acredito que seja complicado analisar alguma coisa de forma moderada.
mariana:
Não é precisa a praxe para integrar, mas ajuda - quando bem conduzida. Lá por as pessoas terem autonomia e capacidade para fazer as coisas, não invalida que possam ser ajudadas. Haverá outras maneiras, certo! Mas a praxe é uma delas.
"a pior humilhação é a que um indivíduo provoca a si mesmo"
Mas a partir do momento em que o indivíduo não se sente humilhado, qual é o problema?
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