quinta-feira, junho 22, 2006

O direito à placa


A mim, não incomoda nada que se dê o nome de Eugénio de Andrade a um beco, ou a coisa nenhuma. É proverbial, mas é verdade: a melhor homenagem que se pode prestar a um escritor é ler-lhe os livros. Ponto. Mas há mais qualquer coisinha. Há o facto de muitos escritores que ninguém lê e ninguém conhece serem nomes de ruas. Há o facto de uma cidade não ter espaço que chegue para tanta gente importante que os tempos vão fabricando. Neste caso, em particular, há o facto de na obra de Eugénio de Andrade também haver páginas em que se diz muito mal do Porto. Sobretudo, há isto: Eugénio afirmou muitas vezes que, apesar de ter vivido décadas no Norte, sempre foi um homem do Sul. Poucas coisas são mais provincianamente pacóvias do que tentar surripiar escritores. O Porto, desgraçadamente, conta com algumas tentativas no currículo. Aquando do Porto 2001, por exemplo, organizaram-se vários volumes sobre "portuenses ilustres". Entre eles, estava Eça de Queirós, que, apesar de ter nascido na Póvoa de Varzim, qualquer pessoa que o conheça medianamente sabe que ele foi, em tudo, lisboeta. Que uma pequena vila ponha uma placa numa estalagem onde um escritor dormiu, por acaso, uma noite, vá lá. Que uma grande cidade faça o mesmo, e mais, é ridículo.

P.S: Também é verdade que começa a ser irritante que alguns intelectuais aproveitem qualquer coisa para criticar a política cultural de Rui Rio e sus muchachos. Se a vida cultural do Porto é pobre, a culpa será só da Câmara?

P.S.2: Sobre a posteridade de Eugénio de Andrade, Eduardo Pitta foi lapidar (ver Mil Folhas de Junho do ano passado): o mais provável é que, dele, fiquem apenas quatro ou cinco poemas. E não há muitos poetas que se possam orgulhar do mesmo.
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1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Gostei acima de tudo da acentuação de filármònica, mesmo ao meu estilo, quando estou sem google bar ...

quinta-feira, junho 22, 2006 9:35:00 da manhã  

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