domingo, fevereiro 19, 2006

Gótico: Charles-Pierre Baudelaire

























As Metamorfoses do Vampiro

E no entanto a mulher, com lábios de framboesa,
Coleando qual serpente ao pé da lenha acesa,
E o seio a comprimir sob o aço do espartilho,
Dizia, a voz imersa em bálsamo e tomilho:
- "A boca úmida eu tenho e trago em minha ciência
De no fundo de um leito afogar a consciência.
Sou como, a quem vê sem véus a imagem nua,
As estrelas, o sol, o firmamento e a lua!
Tão douta na volúpia eu sou, queridos sábios,
Quando um homem sufoco à borda dos meus lábios,
Ou quando o seio oferto ao dente que mordisca,
Ingênua ou libertina, apática ou arisca,
Que sobre tais coxins macios e envolventes
Perder-se-iam por mim os anjos impotentes!"
Quando após me sugar dos ossos a medula,
Para ela me voltei já lânguido e sem gula
À procura de um beijo, uma outra eu vi então
Em cujo ventre o pus se unia à podridão!
Os dois olhos fechei em trêmula agonia,
E ao reabri-los depois, à plena luz do dia,
A meu lado, em lugar do manequim altivo,
No qual julguei ter visto a cor do sangue vivo,
Pendiam do esqueleto uns farrapos poeirentos,
Cujo grito lembrava a voz dos cata-ventos
Ou de uma tabuleta à ponta de uma lança,
Que nas noites de inverno ao vento se balança.

Charles-Pierre Baudelaire
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3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Isto hoje está um bocado tétrico. Baudelaire+Marilyn Manson

domingo, fevereiro 19, 2006 8:02:00 da tarde  
Blogger André Carvalho said...

Sabes Beto, esta coisa da Irmã Lúcia está-me a dar a volta à cabeça. ;)

domingo, fevereiro 19, 2006 8:05:00 da tarde  
Blogger Sílvia said...

Les fleurs du mal... ;o)

segunda-feira, fevereiro 20, 2006 2:13:00 da manhã  

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