segunda-feira, dezembro 26, 2005

Homem não chora [Especial de Natal]

Estou verdadeiramente orgulhoso da minha pessoa. Este ano, finalmente, consegui-me baldar a todas as tarefas que por “neo-tradição” natalícia passaram a ser da incumbência dos homens. Fiz a coisa tão bem feita... que nem a malfadada árvore de Natal montei. Eh, eh, eh.

Claro que tive de recorrer à minha extensa lista de truques de ocasião, mas deu resultado.

Na noite marcada [pela minha mulher] para montar a árvore de Natal [ecologicamente artificial] mais a gaita das luzinhas [os outros enfeites têm usualmente mão feminina] disse que tinha de ir comprar as prendas de Natal, pois estava cheio de trabalho e ainda não tinha tido tempo para as [des]ditas. Isto das “compras” é para as mulheres uma palavra mágica. Fui logo dispensado... não fosse alguma prenda dela estar em risco. Quando cheguei a casa já a arvorezinha estava toda montadinha, e nem sequer tive de a ir buscar à arrecadação. Como convém, fartei-me de elogiar o excelente trabalho dela e dizer que a árvore estava lindíssima e muito bem montada. Por acaso a coisa até não correu mal. Pelo menos, até hoje, a árvore mantém-se de pé. Felizmente que nesse dia ela não me apareceu à frente com os braços no ar. Como todos sabem, mulheres com mãozinhas no ar significa que tiveram a pôr verniz nas unhas, o que implica que nesse dia estamos lixados porque elas não vão querer nem levantar a mesa, quanto mais montar uma árvore de Natal. Nestas coisas a sorte conta um bocado, e também tive a felicidade de nenhuma das 250 lampadazinha dos enfeites estarem fundidas, senão, lá teria à minha espera a árdua tarefa de ter de encontrar as que não funcionavam no meio de todo aquele emaranhado de fios. Acabei por dar graças ao dinheiro que gastei o ano passado num novo conjunto de luzinhas de Natal.

Sou obrigado a confessar que, no início, me senti um bocado mal [comigo próprio] por ter recorrido àquele subterfúgio das compras, mas depois de cinco caipiroskas [três para mim e duas para ela] para comemorar a montagem da árvore, o mal ficou remediado. Apesar de ter uma paixão especial por cães, é por estas - e por outras - que eu costumo dizer que o melhor amigo do homem é o álcool.

Na época natalícia, eu, como muitos outros homens, temos ainda uma outra missão [pouco máscula] a cumprir… na cozinha. É o nosso momento de humilhação anual perante as nossas sogras, que parecem achar muita graça ao facto das filhinhas delas não saberem estrelar um ovo, e vêm embirrar com a forma como nós elaboramos os nossos carismáticos cozinhados. Até os sogros, sentadinhos na sala a ler os jornais, parecem achar graça à situação. Traidores!

Eu até gosto de bacalhau, mas não sei bem porquê, para a consoada prefiro fazer [nem que seja só para mim] outra coisa. Normalmente é o polvo frito [passado previamente por farinha e ovo] com um arrozinho de polvo malandrinho [como manda a tradição em Trás-os-Montes]. O problema é que quando um gajo está a cozinhar, a cozinha fica, necessariamente, num completo chavascal. As limpezas ficam, tradicionalmente [na minha tradição pelo menos] para… mais tarde, e sempre que possível, para a D.Ausenda [empregada doméstica]. Só que as nossas sogras gostam de entrar na cozinha quando está tudo revirado, e enquanto nós estamos plenamente concentrados na nossa arte culinária. Elas fazem isto de propósito, só para fazerem olhares de desaprovação e fazerem-se enojadas sempre que o polvo salta, naturalmente, das nossas mãos para o chão e o voltamos a meter, espontaneamente, na panela. Até parece que não conhecem o ditado, «o que não mata engorda». Para não ter de aturar estas merdas, este ano fiz o sacrifício e comi, na consoada, o bacalhau feito pela minha sogra.

Como não dispenso a escolha do vinho, para me baldar totalmente, só faltava livrar-me da preparação e confecção do Peru.

Todos os santos anos a minha sogra, umas duas ou três semanas antes do Natal, começa a chagar-me o juízo com o recheio do Peru. Precisa de saber qual é a receita de peru que vou confeccionar e qual o recheio que vou optar nesse ano. Claro que ela não está nada preocupada com o facto da filhinha dela considerar o recheio do peru como algo inerente ao próprio bicho [não quero jurar, mas até desconfio que na ideia da minha mulher até existam criações de perus, de peruas, e de perus com recheio]. Como manda a minha tradição, este ano, uma semana antes [convém fazê-las sofrer até à última sem por em risco a nossa refeição] informei-a da minha opção e dos ingredientes adicionais que ela deveria encomendar no “seu” talho para fazer o recheio. Não sei se já repararam, mas não há sogra que não tenha o “seu” talho de estimação. É aparentemente uma característica comum a todas as sogras. Parece que ainda não descobriram a secção talho dos hipermercados, e nem sequer sabem o que são compras on-line, pois têm sempre os mouros dos genros para lhes acartarem com as compras mais pesadas. Fazem isto tudo só para complicar as vidas dos genros. E por falar em complicar... porque é que temos de ser sempre nós [homens] a ter de carregar sempre com a porra dos pacotes de leite, as garrafas de óleo de cinco litros, os pacotes de arroz, de massas, os filhos, etc., e as nossas amadas esposas levam sempre o papel higiénico, os guardanapos e outras coisas similares? Quer dizer, andam a gastar uma pipa de massa a irem todos os dias para os ginásios cuidar do físico, mas quando é para carregar qualquer coisinha com mais de 100 gr… calha sempre aos "bois"[de carga]. Isto simplesmente... não é justo!

Voltando à minha estória natalícia… como na sexta-feira tive de ir trabalhar, antes de voltar para casa telefonei à minha mulher a dizer que estava com uma ligeira dor de cabeça, e que ela dissesse à mãe dela para ir adiantando o “arranjo” do bicho pois, ainda tinha de ir fazer umas comprinhas de última hora quando saísse do trabalho. Aqui utilizei duas palavras mágicas: “dor de cabeça” [coisa habitual no sexo feminino] e “comprinhas”. O certo é que ela foi bastante compreensível comigo. Quando cheguei a casa, a minha sogra já tinha tratado de temperar o peru, e estava todo arranjadinho. Só faltava [tarefa para o dia seguinte] fazer o recheio e metê-lo no forno. Num momento de pura distracção, e em virtude dela ter “arranjado” [completamente] o peru, fiz um elogio à minha querida sogra e, naquele preciso momento, ia deitando tudo a perder. Se há coisa que as sogras desconfiam logo é quando um gajo lhes faz elogios. Tenham sempre isto em atenção e nunca cometam este erro básico. Felizmente, porque achei que não convinha abusar da sorte, tive o discernimento de ter passado antes pelo Fonte Nova [Centro Comercial em Benfica] e ter trazido duas orquídeas [uma para a filha e outra para a sua querida mãezinha] e consegui-a desta forma convencer que, neste ano, eu estava completamente imbuído do tal de espírito natalício.

Como só faltava livrar-me de fazer o recheio, na véspera de Natal, mal me levantei, disse à minha mulher que tinha que ir ao Colombo, sem falta e com muita urgência, levantar uma prenda [para ela] que tinha encomendado no dia anterior. Antecipando-me a qualquer questão, informei-a logo que não valia a pena preocupar-se porque eu ainda vinha a tempo de fazer o dito recheio. Lá sai e, tal como já tinha pré-programado, telefonei-lhe passado uma hora a dizer que o melhor era a rica mãezinha dela ir adiantando o recheio porque o Colombo estava “de morte” e não sabia a que horas me iria conseguir livrar daquela “confusão” toda. Claro que aproveitei aquelas duas horinhas livres para vasculhar a FNAC de uma ponta à outra.

Mal cheguei a casa fiz um ar muito cansado e simultaneamente bastante desapontado por não ter sido eu, este ano, a fazer o peru. Enquanto ia inventando o meu "filme de horror" no Colombo, e como as expressões delas não pressagiavam nada de bom, em simultâneo, fui tratando logo de começar a servir as bebidas [alcoólicas] para o pessoal todo, de forma ao meu “lamentável” atraso ser rapidamente esquecido. Aproveitei para dizer que elas estavam as duas lindíssimas [também costuma dar bons resultados]. Em vez dos habituais dois dedos de gin Gordons e o resto de água tónica, espetei-lhes dois dedos de água tónica e o resto de gin. No início queixaram-se que estava muito forte mas eu disse-lhes que deveria ser impressão delas por ainda estarem de estômago vazio. Afiancei-lhes que os tinha feito fraquinhos como habitualmente. Passados cinco minutos já nem eu me lembrava do Colombo... quanto mais elas.

Como o bacalhau até não estava mau, o peru ficou delicioso, e como a coisa correu bastante bem, não podia deixar de partilhar esta minha experiência com os meus leitores habituais, na esperança que esta estória vos venha a ser útil num futuro próximo.

Boas Festas!
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6 Comments:

Anonymous Anónimo said...

;)

terça-feira, dezembro 27, 2005 10:54:00 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

obviamente que a tua mulher não deve lê o que escreves :)

terça-feira, dezembro 27, 2005 11:34:00 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Caro anónimo das 11:34,

A minha mulher realmente não lê o que eu escrevinho por aqui, mas mesmo que o fizesse não haveria qualquer problema porque mais de metade é inventado por mim. :)

terça-feira, dezembro 27, 2005 12:35:00 da tarde  
Blogger Dinada said...

Já me fartei de rir com o texto, André!

Parabéns :D

terça-feira, dezembro 27, 2005 1:20:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Isto é só rir. ;)

terça-feira, dezembro 27, 2005 10:03:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Se um "homem não chora", muito menos tem "uma ligeira dor de cabeça" - onde é que já se viu um homem com dor de cabeça e ainda por cima ligeira! - e quando tem de gastar dinheiro, vai comprar uma coisas, quanto muito, faz compras, mas nunca "comprinhas"!!!
Um homem para mostrar que realmente não chora até é capaz de chorar um bocadinho!...

quarta-feira, dezembro 28, 2005 2:40:00 da manhã  

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