terça-feira, agosto 16, 2005

LIGAÇÕES PROMÍSCUAS E BONIFICAÇÕES GENÉTICAS

Na semana passada, a Bloquista Joana Amaral Dias referiu-se na parte final do seu artigo de opinião publicado no DN (09.08.2005), com o título «Portugal debaixo de fogo», a umas supostas «ligações perigosas» que existiriam na Portugal Telecom, devido ao facto, inequívoco, desta importante empresa nacional empregar numerosos filhos e familiares de políticos conhecidos da nossa praça, assim como ex-políticos.

Logo no dia seguinte foi publicada no mesmo jornal a resposta do Professor Marcelo que “naturalmente” saiu em defesa do seu filho ou… talvez dele próprio. Dois dias depois de ser publicada a crónica de Joana Amaral Dias, utiliza também o direito de resposta no mesmo jornal, André, o descendente de Jorge Sampaio. Ainda fiquei à espera que outros visados utilizassem o direito de resposta nos dias seguintes, mas tal não sucedeu… nem me parece que vá suceder, pois é mais que provável que alguns dos citados no artigo de opinião de Joana Amaral Dias tenham o “rabo entalado” e não lhes convenha nada fazer ainda mais “ondas”.

Apesar de todos sabermos que a Portugal Telecom tem dezenas de milhares de funcionários e por este mesmo motivo ser natural que um número considerável de familiares de figuras políticas possam lá exercer as suas profissões, a verdade é, tal como demonstra inequivocamente o recente mau exemplo de Armando Vara na CGD, existe muita promiscuidade entre o poder político e o poder económico. No meio destes imbróglios é natural que possam pagar alguns (poucos) «justos por pecadores».

Mas, por muita razão que tenha o Professor Marcelo nos argumentos que utiliza na defesa do seu filho, convém relembrar que há muita gente com habilitações, com qualificações e com perfil para também poderem exercer funções de topo na Portugal Telecom ou noutras empresas, mas, por não serem «filhos de boa gente», acabam por não ter qualquer possibilidade (ou facilidade) de acederem a esses lugares... nem que seja, numa situação extrema, pelo simples facto de não puderem "tirar" mestrados e/ou doutoramentos em Harvard ou Singapura.

Igualmente ingénua é também a resposta de André Sampaio quando refere em sua defesa as médias finais que obteve no secundário e na universidade (ensino público - como o mesmo fez questão de deixar claro), como se estas fossem garantia de entrada na Portugal Telecom ou em qualquer outra empresa. A ingenuidade de André Sampaio é tanta que nem tem a noção que existem centenas de pessoas que terminam os seus cursos com notas melhores e/ou similares às dele e nem sequer conseguem exercer a profissão para a qual obteram qualificação académica. Sem querer tirar o mérito à média final de curso de André Sampaio – pois nem sequer conheço as circunstâncias de facto – há uma coisa que eu tenho a certeza: neste país, se por coincidência um individuo for filho e/ou familiar de “gente importante” e simultaneamente tirar boas notas, acaba sempre por obter uma “bonificação genética”. Não tenho qualquer dúvida que num país como o nosso, um aluno que seja filho de pai ignoto e que termine o seu curso com uma média final de 16 valores, se porventura fosse filho de pais ilustres acabaria por obter mais um ou dois pontinhos de “bonificação genética” no final da sua vida académica.

Estranho (ou talvez não) é a reacção de Joana Amaral Dias na
edição de hoje do DN e no seu blogue «bicho-carpinteiro» (11.08.2005), onde se limita a dizer que «(...) não se tratava de nenhum ataque pessoal, mas apenas do realçar da "coincidência" de a PT empregar os "filhos" referidos, e muitos outros ex-governantes (...)», "refugiando-se" ainda em fontes supracitadas (outros jornais e blogues).

Se os nossos políticos fossem sérios, os seus filhos poderiam exercer qualquer profissão em qualquer empresa sem qualquer contestação ou dúvida pública quanto às capacidades e qualificações dos mesmos. Infelizmente, o que se constata, é que estas graves e sistemáticas injustiças sociais não tem a menor importancia para os nossos políticos (mesmo os ditos mais sérios). Não há um político neste país que não saiba que existe uma ampla promíscuidade nestas relações político-económicas, mas, quando confrontados, limitam-se a defender a si e aos seus, esquecendo-se que muita da proeminência social que granjeiam é devida a uma grande maioria de cidadãos honestos, pelos quais, deveriam-se sentir na obrigação de tentar impedir por todos os meios (se necessário criar novos quadros legais) para que os seus colegas menos sérios continuem a tentar obter benefícios imerecidos para os seus familiares em detrimento de outros cidadãos que justamente poderiam ocupar esses lugares que continuam a ser usurpados impunemente ao longo destes 30 anos de "Democracia".

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