sábado, março 31, 2007

Rock e ocultismo

Não poderia encerrar a minha participação na Festa da Música do GR sem me referir à divertida relação que existe entre o rock e o mundo do ocultismo.

Segundo reza a lenda, tudo começou com a associação ao satanismo de um dos maiores músicos de blues da década de 30, Robert Johnson. O filme "Crossroads" (A Encruzilhada) aborda superficialmente a história do pacto que Robert Johnson teria feito em troca da sua genialidade musical. Deixo de seguida o excerto do famoso duelo de guitarras de "Crossroads", interpretado magistralmente por um dos mais virtuosos guitarristas de rock da actualidade, o espalhafatoso Steve Vai, que representa no filme uma espécie de demónio da guitarra:


Mas a associação entre o mundo do rock e o ocultismo seria retomada, em força, décadas mais tarde, e direccionada para bandas como Rolling Stones, The Doors, Led Zeppelin, e Beatles. Consta que John Lennon tinha bastante interesse pela obra do famoso mestre do ocultismo, Aleister Crowley*. Fascínio que levou os Beatles a colocarem a figura de Crowley na capa do álbum Sgt. Peppers. Aliás, por Mr.Crowley ser uma figura recorrente em temas rock de sucesso, é também um dos principais responsáveis pela associação que se faz entre o rock e o ocultismo.

Porém, a verdadeira associação, a ser feita, não passaria da tradução musical da obra de alguns dos maiores génios literários da história da humanidade. Assim sendo, não é difícil de detectar a corrente simbolista de Charles Baudelaire na maioria dos temas dos HIM, como em "Poison Girl"; ou recordar os fantásticos contos de Edgar Allan Poe, como "Murders In The Rue Morgue", revisitados por Iron Maiden, ou "The Call of Cthulhu" de H.P. Lovecraft, musicado por Metallica.

Como a partir de amanhã, aqui no GR, a Festa da Música vai dar lugar ao Mês da Poesia, termino com esta brilhante adaptação de, "The Rime of the Ancient Mariner", do poeta Samuel Taylor Coleridge, uma vez mais, na voz de Bruce Dickinson.

* Fernando Pessoa também traduziu para português alguns poemas do famoso ocultista inglês, e Crowley chegou a deslocar-se a Lisboa para conhecer pessoalmente o nosso poeta, com o qual compartilhava o gosto pelo ocultismo.

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a falta que faz um sobrenome...

Como a nancy já tinha referido, esta semana, tivemos Maria João Auditório de Gaia - wow!!! Mas agora não vou falar do concerto, vou falar dos dias que o antecederam. Pois bem, sabendo eu do acontecimento, tratei de espalhar a notícia, a ver se arranjava companhia... Qualquer coisa como:

Na 5a há Maria João (jazz) no Audtório de Gaia. 21h30. 15€. Vou comprar bilhetes. Alguém está interessado?

Aquele «Maria João (jazz)» foi já uma tentativa de dissipação de dúvidas, mas mesmo assim não resultou à primeira: Maria João? Que Maria João? A Pires?

Esclarecimentos vários: A Maria João que canta jazz. A Maria João do Mário Laginha, mas a solo. A Maria João daquele programa da RTP. A Maria João toda maluca (com o devido respeito). A Maria João dos tó-tós.

Já agora, a senhora [catalogada em João, Maria] chama-se: Maria João Monteiro Grancha.

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Femme Fatale

Esta é a minha música preferida dos Velvet Underground.
A senhora que canta chama-se Nico é alemã e conviveu durante alguns anos com os Velvet e o ambiente nova-iorquino.
Velvet e depois Lou Reed a solo são um marco extraordinariamente importante na história do Rock.
Aprecio o olhar clínico de Lou Reed sobre tudo o que o rodeia.
É um músico de excelência que, ao longo de várias décadas, nos foi proporcionando várias obras primas, trago-vos apenas duas delas a inicial e Walk on the wild side.

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sexta-feira, março 30, 2007

Da Música

É dos livros: a música é a mais universal das artes. Universal porque é susceptível de ser percepcionada por todos, porque basta saber assobiar para criá-la, porque consegue expressar todos os matizes do espírito humano, porque não conhece fronteiras, línguas ou religiões. A música é, igualmente, individual. Uma mesma música é interpretada de maneira diferente de indivíduo para indivíduo, e cada um desses indivíduos pode dar diferentes exegeses à mesma música, normalmente por variações do tempo, do espaço e do estado de espírito, conduzindo a que aconteça um movimento curioso: uma canção é universal, por aquilo que atrás se aduziu. Quando é apropriada por uma pessoa, torna-se individual. Já «dentro» dessa pessoa, ela volta a tornar-se universal na medida em que pode tomar uma pluralidade de interpretações, não pela subjectividade óbvia de cada indivíduo, mas porque para um mesmo indivíduo, a mesmíssima música pode despertar uma miríade de emoções, no limite contrárias, devido às circunstâncias em que é escutada: a arte é a mais universal das músicas.

A música está para mim como as «madalenas» estavam para Marcel Proust. Cada vez que meto um disco a tocar, é uma viagem no tempo que faço. Recordo nitidamente situações, pessoas, momentos. As canções são cábulas da história da minha vida.
Ao longo da Festa Música (FM), fui falando daqueles que estão no topo da pirâmide dos meus gostos. Hoje, trago-vos aqui os que estão na base. A base da pirâmide é sempre mais larga. Como tal, tratarei de deixar apenas links, e dentro destes algumas dedicatórias a quem teve a amabilidade fazer referência à FM.
Para finalizar quero corrigir aqui uma injustiça que os dicionários de sinónimos cometem: música significa, essencialmente, amizade. E é com essa amizade que dedico este post n.º 3000 (e respectivo vídeo) do Geração Rasca ao André, à Cristina, à Nancy e à Leonor.
Pink Floyd, R E M, Radiohead, Manic Street Preachers, Oasis, Mão Morta, Andrew Bird, The White Stripes, The Killers, Interpol, Muse, Therapy?, Suede, Tchaikovsky, Within Temptation, Sisters of Mercy, Dead Can Dance, Dave Matthews, Patrick Wolf, The Animals, Placebo, The Who, Megadeth, David Bowie, e muitos muitos outros, entre os quais estes senhores que esta noite vão actuar exclusivamente para os meus colegas do GR:


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There Will Be A Light

Em Portugal, durante todo o século XX, existiu sempre a tentação de uma ideologia política anular a outra.

Durante o Salazarismo a esquerda foi completamente ostracizada, eu não vivi tempo suficiente durante o antigo regime, para sentir qualquer tipo de malefício deste sobre mim.

Lembro-me do dia 25 de Abril e das imagens veiculadas pela TV a preto e branco e da alegria espalhada nos rostos.

Mas do interior vinha um eco de: parece que em Lisboa aconteceu qualquer coisa.

Viver num regime onde não se pode manifestar discordância política é extraordinariamente desagradável tanto em termos intelectuais como em termos físicos.

Contudo, depois da revolução dos cravos, o PCP pretendeu implementar um regime determinado e resquícios dessa tentativa foram demasiado dolorosas, para mim, e para todos os que não se sentiam minimamente atraídos por aquele tipo de regime.

É claro que nós sabemos que a base teórica do comunismo era ligeiramente diferente e que o sistema político fascista do “alguns serem mais iguais do que outros” pretendia ser substituído pelo revolucionário “alguns seriam, inevitavelmente, mais iguais que outros” ah e sabemos, também, que os protagonistas vestiriam de maneira ligeiramente diferente.

Não gosto do que simboliza o Salazarismo. O Salazarismo é a apologia da ideia comum que ainda hoje prevalece na igreja portuguesa: as famílias bem têm mais direitos que a ralé, a ralé tem apenas deveres e uma grande dívida para com a sociedade. Acontece que esta ideia, ligeiramente democrática, para meia dúzia, foi substituída durante largos anos por uma outra, extraordinariamente inovadora, quem é de esquerda é intelectualmente superior e inovador e irreverente e todos os outros são fascistas e gentalha desprezível. E, no meio disto tudo, o povo?

Bem o povo... vocês sabem... precisa de ser educado!

O problema da esquerda é que levou alguns anos a perceber que o povo não quer ser educado da mesma maneira; que sistemas de igualdade, ao nível profissional, por exemplo, geram profissionais irresponsáveis, arrogantes e corporativistas; e que nenhuma ideologia consegue transformar intimamente o homem.

O Portugal que deu votos a Salazar revela alguns ressentimentos:

- a direita que dificilmente se revê em Salazar mas que vota massivamente no ditador para se vingar do ostracismo a que Cunhal a votou;

- revela o povinho: o povinho não gosta de Cunhal, a igreja ensinou-o que os comunistas comem criancinhas e o povinho quando quer aprende; mas este povinho iletrado, analfabeto e alienado por meios da comunicação social como a TVI, por exemplo, foi, muito ironicamente, também “deseducado” pelos diversos sistemas de ensino que a esquerda foi “experimentando” ao longo de diversos anos. E o povinho também aprendeu pela escola da esquerda, pois quando quer aprende, que é melhor sermos funcionários públicos e fazermos de conta que produzimos.

- revela a esquerda extra-PCP de mal com o PCP, com Sócrates e ainda não refeita da orfandade de Mário Soares (foi essa esquerda de cabeça perdida que convenceu o velho leão a encarnar o seu papel preferido o de salvador da pátria).

E este é o Portugal do presente:

Universidades privadas que são um autêntico ninho de sabe-se lá o quê; de associações universitárias que são o ninho dos futuros políticos e autarcas do nosso país: licenciados em coisa nenhuma; de povinho deseducado por um sistema de ensino que se preocupa acima de tudo com o politicamente correcto: o insucesso escolar e tudo isto sem o mínimo de visão, com palavras ocas e para jornal mostrar; por empresários mal formados para o mundo dos negócios; por médicos irresponsáveis e sugadores do sistema de saúde; por um sistema de justiça corporativista, injusto e irresponsável, etc, etc, etc.

E os portugueses do presente não aguentam o seu Portugal porque:

- ainda não perceberam que é tempo de curarmos as feridas,
- ocuparmos os nossos lugares na sociedade,
- expulsarmos a má moeda
- e seguirmos em frente, unindo esforços e prosseguindo num objectivo comum: Portugal, um país de futuro.

Mas tudo isto, caríssimo leitor, é utopia pura e dura, pois nós sabemos que é muito mais interessante assistir à partida da bancada e chamar nomes ao árbitro, aos jogadores, ao treinador e curarmos as feridas com a verborreia dos "opinion maker" tão visionários e tão participativos no nosso passatempo preferido: enlamear a pátria, fazendo de conta que ela não lhe pertence e continuar despreocupado quanto ao seu empenhamento profissional, ao seu conhecimento, à sua motivação, à sua mais-valia enquanto ser humano.

Afinal o tempo muda-nos
mas
não deveríamos perder a crença
na nossa força
e na nossa luminosidade...

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quinta-feira, março 29, 2007

Filhos do cê dê ésse [Parte 2]

Com o ambiente que se vivia em Lisboa naquele período pós-revolucionário, ainda hoje tenho alguma dificuldade em encontrar uma explicação verosímil para o facto de não ter sido arrastado pela avalanche trotskista-maóista-marxista-estalinista-leninista que varria o país de lés-a-lés. Como já meditei bastante sobre o assunto, a melhor explicação que encontrei para a minha miraculosa bem-aventurança baseia-se naquela soberba aptidão que as crianças têm para reconhecer um aldrabão à distância. Deverá ter sido graças a esta prodigiosa capacidade infantil que nunca fui enrolado pelas falinhas mansas do camarada Mário Soares, assim como também nunca caí naquela estória de que o Álvaro Cunhal tinha vindo da ú érre ésse ésse.

Já nesse tempo não era preciso ser-se muito inteligente para se depreender através da fisionomia do secretário-geral do pê cê pê que ele só podia ter vindo directamente da Roménia, mais precisamente, da Transilvânia, e era, com toda a certeza, um parente bastante próximo do Conde Drácula. Mas o pior aconteceu quanto contei esta descoberta ao meu colega de carteira que nunca perdia os desenhos animados checos do Vasco Granja. Chamou-me logo de fascista. Depois de lhe ter partido uma régua na cabeça, não perdeu tempo a denunciar-me à camarada professora.

Sabendo de antemão que a camarada professora era comunista, temi seriamente pela minha segurança, e já imaginava o COPCON a entrar por ali dentro e a levarem-me para ser interrogado pelo camarada Otelo. Só descansei depois da camarada professora me ter chamado e procurado convencer que se os comunistas fossem de facto vampiros, nunca defenderiam um sol a brilhar para todos nós.

Para não complicar ainda mais as coisas fiz um ar bastante arrependido, igual àquele que via os pides fazer na televisão, mesmo tendo a consciência que aquilo do “sol brilhará para todos nós” não passava de mais um inteligente estratagema dos comunistas para esconder o facto de andarem mesmo a sugar o sangue das criancinhas. Felizmente que não tinha contado toda a verdade ao meu colega delator, caso contrário teria sido o meu fim. Pois nem sequer a camarada professora conseguiria arranjar uma boa desculpa para o facto do camarada Álvaro Cunhal, tal e qual um bom vampiro, dormir sempre em local incerto, e desconhecido do mais comum dos mortais.

Apesar de até àquele dia sempre que alguém me perguntava o meu partido eu nem sequer hesitar – levantava o braço esquerdo e de punho cerrado gritava, “éme érre pê pê” –, a verdade é que foi a partir daí que me apercebi que morava dentro de mim um ainda desconhecido gene direitista que, para meu próprio bem, teria de aprender a dominar.

[continua…]

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Turn Your Lights Down Low

Odete Santos dizia há dias que não gostava da valsa por ser uma música da burguesia.
Eu acho piada à teatralidade de Odete Santos.
E admiro deveras a sua capacidade racional de ter adequado de tal maneira o seu gosto musical à sua ideologia.
Infelizmente, a mim, há músicas que me tocam.
Apesar de, aparentemente, não possuirem nenhuma razoabilidade nem intelectual nem ideológica.
Infelizmente, para mim, o interessante na música é a sua tendência em "apanhar-me" sem qualquer espécie de razoabilidade intelectiva.
Também aprecio utopias e Bob Marley e Lauryn Hill especialmente.

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A Memória Dos Dias (Fausto)


Não tenho vídeo, desta vez... Mas peço-vos, encarecidamente, que sigam o link acima e ouçam o que vos trago hoje, a fechar a minha participação oficial nesta Festa da Música. A música tem mais de 12 minutos... Ouçam-na, pelo menos uma vez, até ao fim... Abaixo segue um texto que escrevi na altura em que a (re-)descobri.

[Edição: É com muita, mas mesmo muita, pena minha que constato que o link acima parece estar indisponível... Resta-me então deixar-vos uma pequena gota (de 1min11s) do oceano que é "A Memória Dos Dias"...] Ouvir excerto
[Re-edição: Afinal o link lá de cima vai e volta... Deixo, na mesma, a ligação para o pequeno excerto, mas, se estiver disponível, não deixem de ouvir a versão integral no ÁUDIO ali em cima....]


Queria falar qualquer coisa sobre Fausto...

Recapitulemos primeiro umas coisas: eu cresci a ouvir Fausto nas cassetes gravadas do meu pai. Aquilo sempre me soou bem, apesar de não fazer ideia do que diziam as letras. Essas duas cassetes ainda vivem (apesar de já não estarem muito bem de saúde) e há uns anos (poucos) passaram da caixa de arquivo do meu pai para o meu quarto. Só nessa altura decidi prestar atenção às letras... e assustei-me de tanto sangue e tanto morto que por lá havia! Mas não ia ser por isso que iria deixar de gostar das canções. Em especial, "Como um sonho acordado", que sempre foi umas das minhas favoritas, tem um impacto particularmente forte quando se presta atenção à letra.

O meu pai comprou "Crónicas da Terra Ardente" que ouvi poucas vezes, pois de cada vez que pegava no CD ficava à espera das canções da minha infância que não apareciam...

Entretanto, oferecemos ao meu pai "Grande, Grande é a Viagem", que me deu a conhecer outras músicas, com a vantagem (ou não) de ser uma selecção de mais do que um álbum e a grande, grande vantagem de ser um CD e não uma cassete. No entanto "Como um sonho acordado", "O cortejo dos penitentes" e "O romance de Diogo Soares" (que fazem parte das minhas memórias de infância) não constam nessa selecção, o que me fez ouvir vezes sem conta a velhinha cassete 1 do meu pai.

Fui ao concerto no Coliseu [Junho/2005] sem conhecer mais do que isto sobre a obra de Fausto. As músicas do concerto (que nunca tinha ouvido!) reavivaram a memória de uma sonoridade tão característica que me fez sentir que afinal, apesar de tão pouco, até conhecia alguma coisa sobre Fausto.

Nos tempos que se seguiram estive mais atenta ao que se dizia sobre Fausto e (pasmo!!!) só nessa altura - na Laranja Amarga - descobri a existência da tão famosa e ainda inacabada triologia.

Mais recentemente, tendo em conta a boa impressão com que tinha ficado do concerto, finalmente comprei a "Ópera mágica do cantor maldito" (desta vez para mim, e não para o meu pai!).

Ontem lembrei-me que já não fazia ideia do que tinha a cassete 2 e hoje levei-a comigo para o carro. E foi aí que senti a necessidade de falar de Fausto. É que, em plena auto-estrada, sozinha no carro, com a música bem alto emocionei-me ao ponto de me virem duas ou três lágrimas aos olhos. Nunca me tinha acontecido isto, pelo menos ao ouvir apenas a música pela música; é diferente quando a música nos traz algum tipo de recordações... mas não foi o caso. A música em si foi demasiado forte...

Chegada a casa, tentei saber mais alguma coisa sobre a música da qual nem sequer o título eu tinha. Lembrei-me do "cantinho" que a Laranja Amarga tinha dedicado ao Fausto e fui lá espreitar a ver se descobria alguma coisa. E achei uma descrição, também do Nuno Sousa, que se encaixava perfeitamente naquilo que eu tinha ouvido:

«E que dizer daquela abertura, daquela primeira canção "A Memória Dos Dias"? Trata-se de um caminho musical, porventura menos popular, que Fausto não explorou ainda totalmente (nem nada que se pareça) e que, a avaliar pela amostra, poderia dar frutos apetitosos.»

Mais umas buscas para ver se a letra dessa música coincidia com a da cassete [que tive de ir ouvir outra vez, pois com a força da música nem prestei atenção letra]... e voilá! é mesmo "A Memória Dos Dias".

Nestas buscas descobri também outra coisa que, por incrível que pareça, ainda não sabia: as velhinhas cassetes do meu pai são gravações quase integrais de "Por este rio acima" e "O despertar dos alquimistas".

E pronto, tudo isto para dizer que acho que achei uma nova paixão: "A Memória Dos Dias"!!!

Outubro/2005

A Memória Dos Dias
Fausto Bordalo Dias [em inglês] [em português]
álbum: O Despertar dos Alquimistas (1985)
letra: (não encontro disponivel em lado algum... um dia destes eu transcrevo-a... agora não, que o post já vai longo...)

imagem:
CDGO

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quarta-feira, março 28, 2007

Os verdadeiros dramas do país real

Os comunistas, bloquistas e outros istas, andam indignadíssimos com a “instrumentalização” da RTP, e com aquilo que apelidam ser o “branqueamento de Salazar”. Os bloquistas, sempre muito afoitos nestas matérias, até já admitem chamar ao Parlamento o director de programas da RTP.

Aproveitando a onda dramática, a CGTP também já avançou com um pedido na ERC de suspensão do concurso “A Bela e o Mestre”, porque entende ser um programa que “viola o princípio de igualdade entre sexos”.

Estes acontecimentos fazem-me lembrar esta canção revisteira dos “Agostinhos”, interpretada pela dupla Ivone Silva/Camilo de Oliveira:

Ai Agostinho
Ai Agostinha
Que rico vinho
Vai uma pinguinha?
Este país perdeu o tino
A armar ao fino, a armar ao fino
Este país é um colosso
Está tudo grosso, está tudo grosso
Isto é que vai uma crise, isto é que vai uma crise!

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O Punk e as minhas memórias pós-revolucionárias

Quando comecei a ler os primeiros textos sobre o punk pensei:

isto tem tudo a ver comigo!

Detestava o rock sinfónico e tudo o que aquela corrente simbolizava, no meio de toda aquela parafernália de sons gostava ligeiramente dos Queen e da, actualmente, demasiado desgastada Bohemian Rhapsody.

Considerava execráveis os Emerson, Lake and Palmer, Genesis, Camel e Renaissance, achava apenas piada a alguns temas dos Jethro Tull e dos Pink Floyd.

O Punk apareceu, para mim, na altura certa, pois tudo o que se produziu a partir daí teve sempre muito mais a ver comigo e com o meu gosto musical.

Lia a Bravo, a Música e Som e uma ou outra revista que circulava pela escola e fascinavam-me os visuais de bandas como: Sex Pistols, Ramones, The Stooges, The Clash



Boomtown Rats, The Jam, Siouxsie & The Banshees, The Stranglers, Ultravox; e do lado de lá do Atlântico Blondie, Patti Smith, Television e Dead Kennedy's. Data dessa altura a descoberta de uma banda dos sessenta os Velvet Underground.

Para além do visual fascinavam-me as afirmações políticas e socialmente incorrectas daqueles grupos; diziam enormidades nas entrevistas sem estarem preocupados com as reacções.

Imaginava-me a dizer coisas semelhantes aos meus amigos de esquerda, de direita ou do centro e exercitava a imaginação engendrando as suas infindáveis argumentações.

É que prevalecia, na altura, uma espécie de necessidade escatológica de gostos musicais ideologicamente consentâneos.

Os de esquerda falavam-me na tendência nazi do movimento Punk.

Os de direita do vestuário pouco próprio.

Os do centro insistiam na combinação do maravilhoso e do imaginário na obra dos Yes, algo de inexistente no Punk.

Sempre que falávamos sobre música a conversa descambava para o desacerto ideológico do Punk.

Depois de alguns desconcertos argumentativos resolvi adoptar uma postura musical ideologicamente neutra.

Não me manifestava ou não discordava e, a partir daí, fomos todos muito mais felizes.

É certo que lhe foi inerente um certo regime de clausura interna o que desgastou, para todo o sempre, a minha empatia com monumentos que simbolizem este estado, como, por exemplo, conventos e mosteiros...

google images

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Optimismo, Prudência e Pessimismo

Como aqui muito bem se refere, é de um optimismo ingénuo realizar os concertos que visavam celebrar o 50º aniversário do Tratado de Roma ao ar livre na diluviana Bruxelas. Já os dirigentes europeus, preferiram não embandeirar em arco e fazer discursos mais prudentes quanto ao futuro da UE. Agora só não entendo as escolhas das bandas que actuaram nos referidos concertos: decretar os Scorpions e as Las Ketchup como embaixadores da música alemã e espanhola é, no mínimo, de um atroz e paralisante pessimismo.

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terça-feira, março 27, 2007

Fechando o Verão

Primeiro o impacto das rodas na pista, o batimento cardíaco levemente acelerado e ainda a dúvida. Será? O corpo moído, os olhos morcegos habituados a onze horas de ausência da luz solar e, finalmente, ar livre e rua. A Cidade Maravilhosa amanhecera não havia muito. Talvez por isso tenha tomado por natural uma certa neblina. Certo é que raros são os postais reais e imaginários do Rio de Janeiro onde o céu e o mar não são assustadoramente azuis e belos, o verde, o contraste perfeito e o Cristo Redentor, pacífico e sereno abraçando a cidade lá em baixo, intocável, impassível perante a vida dos homens turbulenta tão abaixo do seu pedestal inabalável. Neblina, porquê, então? E depois rumámos pela Linha Vermelha para a Zona Sul. Pela janela, ia procurando. Nada. E depois no hotel a conversa para casa e a pergunta facilmente adivinhável E o Cristo? Já viste o Cristo? Não, o tempo está meio cinzento. De tarde, a neblina adensara-se, o tempo fechara completamente e o postal do Rio que lentamente se desenhava à minha frente adquiria tonalidades cinzentas, salpicadas pela Mata Atlântica, uma bruma obstinada mais translúcida, a espaços, como um véu a envolver o Cristo Redentor. Outras cores diferentes das que fui acalentando ao longo de décadas. O castanho do encavalitado das casas morro acima. Nos três dias seguintes chuvas, a pergunta de sempre, e nos três dias seguintes a descoberta e a certeza que, mesmo com chuva, a cidade jamais sairá beliscada e adquire uma aura de mistério e serenidade. Da janela do quarto, o Calçadão e o mar revolto, o Tóni dos Cocos recebendo a sua carga diária bem cedinho pela manhã, os cariocas ainda assim usufruindo a cidade que é deles, uma peladinha de final de tarde, um jogging, uma água de coco debaixo do chapéu, outrora de sol, agora de chuva e o camelô que guardara sua mercadoria. Chuva, o meu Rio tinha agora chuva. Tornara-se mais nostálgico, enlaçado na melancolia dos trópicos, salpicado daquelas teimosas águas de Março que descolorindo a cor vibrante do meu postal imaginário, o preencheram melodiosamente com a voz de Elis avisando que estavam fechando o Verão.

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Porto versus Lisboa [revistado]

Estive em Lisboa no passado fim-de-semana e, no sentido de aproveitar o tempo livre que iria ter, decidi espreitar a agenda cultural daí do sítio... Fiquei parva! A oferta era tanta que, eu acho que, se morasse em Lisboa, não fazia mais nada. Diz-me prontamente um amigo: "E tu moras no Porto! Imagina se morasses numa terrinha no meio de coisa nenhuma!..." Pois... tendo isso em conta não me posso queixar muito... Mas, o resto do país que me perdoe, mas vou ignorá-los por uns momentos...

Na área da música, e principalmente se não estivermos à procura dos grandes espetáculos comerciais, há por aqui boa programação regular, apesar de poder ser preciso alargar um bocadinho o raio de alcance. E a Casa da Música foi, de facto, uma "invenção" fantástica...

Mas no teatro (e na dança) a diferença é descomunal! A variedade e regularidade das peças por aí é dificil de se ver por cá. A multiplicidade de teatros (activos), as companhias residentes e as peças que permanecem em cena durante meses foi o que me saltou à vista nesta comparação...

Portanto, "gentes daí de baixo", façam o favor de aproveitar, sim?

Resta dizer que hoje é Dia Mundial do Teatro, e, portanto, o teatro anda à solta um pouco por todo o país - e muito por Lisboa ;)

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Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

O resultado da votação foi a seguinte:

1º António de Oliveira Salazar - 41,0%
2º Álvaro Cunhal - 19,1%
3º Aristides de Sousa Mendes - 13,0%
4º D. Afonso Henriques - 12,4%
5º Luís de Camões - 4,0%
6º D. João II - 3,0%
7º Infante D. Henrique - 2,7%
8º Fernando Pessoa - 2,4%
9º Marquês de Pombal - 1,7%
10º Vasco da Gama - 0,7%

Nesta votação espanta-me o terceiro lugar de Aristides de Sousa Mendes.
Os dois primeiros lugares são óbvios, são os que se aproximam da memória histórica e colectiva presente.
Eu votaria sem hesitar no maior poeta português de todos os tempos: Luís de Camões, mas compreendo que para muitos isso seja impossível, dado que, de geração em geração, houve uma espécie de concertação silenciosa e pedagógica, que alimentou a nossa relação de amor
com o épico português.
É claro que essa relação de amor teve a capacidade de desenvolver um ódio
muito saudável e pouco ressentido, sintoma aliás comum a qualquer relação de amor... saudável.

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Strawberry Fields Forever

São quase octagenárias.
Rio-me imenso com elas.
Um caso vivo de humor e irreverência.
Falam do passado sem despudor.
São do tempo de uma sardinha para três, no tempo em que no Portugal profundo a fome era um lugar comum.
Quando a sardinha não surgia, na mesa concorrida, acalentavam as tripas à luz da candeia.
25 tostões cada par de calças - ainda as ouço murmurar.
Começaram a trabalhar na alfaiataria do pai com 9 anos.
A primeira vez que uma delas foi à Figueira da Foz era já moça namoradeira.
E no regresso ainda contou pasmada ao fidalgo da aldeia:
ah e aquela praça da fruta e toda da boa!
Imagino a revolta que sentiram ontem quando se depararam com a vitória de Salazar.
Para elas o ditador português é o símbolo da fome
mas o comunista? Cruz credo!
também as imagino a dizer com o olhar arregalado.
Para elas Salazar e Cunhal estão ao mesmo nível.

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Grandes Neozelandeses

Fico feliz que os nossos rapazes tenham conseguido o apuramento para o Mundial de Rugby em França. Mas não sei como vai ficar o espírito patriótico da rapaziada quanto tiverem de defrontar a selecção neozelandesa. É que os Allblacks têm o dobro do tamanho da malta, e a Haka Dance inicial é, no mínimo, intimidadora. E apesar dos Neozelandeses serem uns autênticos touros, não me parece que esta seja a resposta mais adequada. Mas podemos sempre tentar vencê-los pelo riso.

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segunda-feira, março 26, 2007

What a difference...

O Espumante deixou-nos aqui «uma performance inesquecível de Jammie Cullum» no barroco de Blenheim Palace, e eu agradeço e retribuo, com outra performance inesquecível no “nosso” José Alvalade.

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E o vencedor do concurso

...«Grandes Portugueses» foi, obviamente, «O Gajo de Alfama».

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foi o que eu disse...

Nem sempre acontece, e quando não acontece fico um bocado reflexiva – sem que isso seja obrigatoriamente negativo... Mas, dizia eu, nem sempre acontece, e quando acontece sinto uma espécie de orgulhosinho simbiótico. Estou a falar da interpretação das obras de arte, seja música, pintura, dança, literatura,... Fico feliz por mim que percebi e pelo artista que se me conseguiu fazer perceber. É claro que nem todos temos de pensar o mesmo e a multiplicidade de sensações gerada pela arte é um dos seus pontos fortes... Mas sabe(-me!) sempre bem ver a nossa tese corroborada pelo autor.

E tudo isto vem a propósito de uma entrevista no Público do passado domingo a Sérgio Godinho, sobre a música seleccionada para o volume 2 da colecção dos 50 anos de música portuguesa.

«Ela é uma celebração da vida, mas da vida consciente. Neste referendo, a respeito do aborto, esta canção foi posta num blogue do não, penso que abusivamente. Houve uma reacção de várias pessoas e eu próprio escrevi um texto, porque a canção é uma celebração da vida, sim, mas de uma vida escolhida e não de um fatalismo.»

Está-se a falar do «Espalhem a notícia» e imediatamente me veio à memória um post que escrevi no início do ano, ainda antes da referida fricção, de que, diga-se, nem sequer tive conhecimento...

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Anarchy in the UI*



Vídeo dedicado a Luís Arouca, o reitor mais punk de Portugal.

* Universidade Independente

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Lá vamos cantando e rindo...

Na primeira fase do concurso votei em Manuel Fernandes Tomás. De resto, nem sequer tive paciência para ver mais de 10 ou 15 minutos de alguns dos episódios da interminável saga. Porém, e por mero acaso, acabei por assistir a alguns dos documentários do programa: Salazar, Fernando Pessoa, Infante D.Henrique, e [pasme-se] até consegui aguentar a primeira parte do documentário de D.João II com Paulo Portas.

Apesar de não ter qualquer dúvida que o Infante D.Henrique é o maior português de todos os tempos, tenho de confessar que se tivesse votado na fase final do programa provavelmente a minha escolha também recairia em Salazar. E não o faria por nutrir qualquer tipo de admiração ou simpatia pelo carismático ditador português, mas somente com o intuito de evitar que Álvaro Cunhal acabasse por vencer o concurso com o voto militante dos comunistas que, ainda assim, o conseguiram arrastar até à fase final do programa e coloca-lo num imerecido segundo lugar na classificação geral.

Pelos mais diversos motivos que não importa aqui referir, compreendo perfeitamente que alguns de vós se sintam frustrados e revoltados com a vitória final de Salazar. Eu sentiria precisamente o mesmo se porventura Cunhal vencesse o concurso [cruzes canhoto!].

No entanto, não fui capaz de deixar escapar uma gargalhada contida [para não ferir susceptibilidades] quando hoje de manhã me disseram que Salazar tinha vencido com 41% dos votos… 33 anos depois da Revolução de Abril.

Apetecia-me agora divagar um bocadinho sobre aquela célebre frase do “volta, estás perdoado”, mas não quero abusar mais da vossa paciência.

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É meu e vosso este fado

Tal como Pacheco Pereira também não gosto das antenas eólicas espalhadas pelas serras, a Serra da Lousã já está pejada destes Adamastores terrestres e, infelizmente, não se vislumbra nenhum génio literário capaz de as desmistificar mitificando-as.
As populações não lutam contra o seu aparecimento, tal como não lutam contra as palmeiras, as rotundas, os prédios, o alcatrão, mais os digníssimos e ousadíssimos sinais exteriores de autoritarismo e megalomania abjecta.
Mas se a preocupação dos intelectuais é pelo direito à contemplação de uma paisagem natural em vias de extinção a dos remediados é pelo pão.
E entre uma e outra decorre uma distância cultural e civilizacional intocáveis.


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domingo, março 25, 2007

Um «H» pode significar antítese

Um é entretenimento em estado puro. O outro é prostração. Um é discípulo de George Michael e Freddy Mercury. O outro tem influências de blues, Waits, Cohen. O primeiro é o talento da competência, o segundo é a competência do talento. Um tem uma voz luminosa, no outro a voz brota da sombra de uma caverna. A perfomance do primeiro é exuberante, a do segundo é esfíngica. Um chama-se Mika, o outro Micah. Acho interessante o primeiro; acho excelente o segundo.



[Micah P. Hinson - Beneath the Rose]

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Triangulações

Enquanto os nossos audazes rapazes se esfalfavam em Alvalade na partida que opôs o mundo do futebol luso à Bélgica, surgia em rodapé no ecrã de televisão que Salazar poderia ser o melhor dos portugueses, posteriormente que quarta-feira a RTP iria dedicar a emissão aos cem anos de Lúcia, a pastora que presumivelmente terá avistado a mãe de Cristo, e que a mesma decorrerá de Fátima. Calculo que a Kátia Guerreiro estivesse a preparar um hino para a esperada vitória do ditador. Depois de Futebol e Fátima, Fado era o vértice em falta nesta curiosa triangulação.
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Chega de Saudade

No CDS o clima é de guerrilha, clima aliás que é tanto mais fleumático quanto a sua novidade.

É que no CDS nunca se cometeram pequenas traições.

Aliás, nem no CDS nem em nenhum partido político, seja português seja de que país for.

Percebo que a política tenha de ser “vendida” através da ideologia, os homens e as mulheres que deixaram de acreditar em Deus, precisam de acreditar noutra coisa qualquer.

Desiludidos fundamentalmente com as atrocidades, regras e catálogo desactualizado da instituição hierárquica que rege a espiritualidade, seja ela qual for.

Como o homem comum tem necessidade de acreditar nalguma coisa, a ideologia foi, durante uns tempos, um substituto razoável.

Retiraram-se alguns valores básicos do homem e cada partido “travestiu-o” de forma ideológica consentânea.

Tem até uma certa lógica.

O problema dos partidos, tal como de todo o tipo de instituições, são os homens. E apesar da literatura correcta pretender mascarar-nos o homem de determinada maneira, sabemos bem que existem emoções difíceis de racionalizar: a inveja, acompanhada da respectiva intriga da corte e da benfazeja traição.

O que se passa nos partidos, passa-se em qualquer instituição cujo lugar seja cobiçado por diversos.

No século XVII houve alguém que se fartou de escrever sobre isto.

Não deveria ser, portanto, novidade.

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Embraceable You

Abraça-me
apesar de eu não ser
abraçável
Sabes
quando olho pra ti
os meus pensamentos
deambulam sem Norte
e tu és uma bússola
uma espécie de guia

Tens de perceber querido
há um certo embaraço
nesses abraços entrelaçados
e hoje
hoje não estou suficientemente
abraçável

Tirando isso
gosto especialmente
da desocupação espiritual
dos teus braços
Sim, gosto especialmente
do desnorte
dos teus braços
mas hoje,
só hoje
não estou suficientemente
abraçável.

Mas
la la la la la la
gosto dos teus abraços
embaraçosos
la la la la la la
embaraçosos

Sarah Vaughan
google images

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sábado, março 24, 2007

Gosto...

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Charlie Charlie


Ricardo Saló pergunta hoje no Expresso: será que a música pop tem futuro?
E encaminha a argumentação em prole de um nome francês que, segundo o crítico musical do semanário, é "uma voz capaz de sugerir o regresso numa pessoa só de Françoise Hardy, Nico e Lizzy Mercier Descloux (?) no quadro de uma admirável reinvenção formal do conceito de «joie de vivre»", quem será esta nova promessa pop? Vanessa Quiñones (Vanessa and The O's), cujo álbum em destaque é: La Ballade de D'O.
Apesar de, por vezes, considerar os textos de Saló escrita para o umbigo, estou sempre atenta às suas sugestões, algumas são claramente audíveis.
imagem

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Canção Verdes Anos (Carlos Paredes)



«Éramos muitos em palco, quase tantos como na plateia... Quando, de repente, o Paredes ataca os "Verdes anos"; e eu pensei que aquele era um tema que tinha adorado no EP que tinha comprado pelos meus 20 anos... Os meus verdes anos... Agora estava num mesmo palco que o Paredes, fazia canções, estava ali num dia tão extraordinário como aquele. Deu-me um daqueles abalos terríveis. Foi um momento mágico, não me esqueço nunca daquele homem curvado, resfolgando e massacrando fraternalmente a guitarra...»
Sérgio Godinho em "Retrovisor", p.55
a propósito de um "canto livre" num país acabado de sair da revolução


É com muita pena que reconheço que não conheço a obra de Carlos Paredes... Conheço-lhe o génio e o reconhecimento quase unânime de todo um país vindo dos mais diversos quadrantes musicais. Mas tenho de admitir que não sei o suficiente para falar da minha boca. Daí a citação inicial, que, representa, aqui, aquilo que eu gostava de sentir, uma espécie de admiração profunda...

Disse assim Paredes:

«Já me tem sucedido fazer as pessoas chorar enquanto eu toco... E eu não compreendia isto, mas depois percebi que é a sonoridade da guitarra, mais do que a música que se toca ou como se toca, que emociona as pessoas.»

«As pessoas gostam de me ouvir tocar guitarra, a coisa agrada-lhes e eles aderem. Não há mais nada.»

O mestre tem razão numa coisa: a guitarra portuguesa "deita música" belíssima! Mas é preciso saber "fazê-la cantar"!!! Embrenhada na minha ignorância da sua obra, admiro-lhe cada peça que lhe ouço como se fosse a primeira vez. Mas "Verdes Anos" é incontornável...

Deixo-vos, então, lá em cima uma sucessão de imagens em torno de Paredes e da sua guitarra ao som de "Verdes Anos" e termino, com Pessoa, dedicando este post ao (nosso!) Carlos.

Oiço, como se o cheiro
De flores me acordasse...
É música – um canteiro
De influência e disfarce.

Impalpável lembrança,
Sorriso de ninguém,
Com aquela esperança
Que nem esperança tem...

Que i
mporta, se sentir
É não se conhecer?
Oiço, e sinto sorrir
O que em mim nada quer.

Fernado Pessoa


Canção Verdes Anos
Carlos Paredes
EP: Verdes Anos (1962)
álbum: Guitarra Portuguesa (1967)

imagem: CDGO

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sexta-feira, março 23, 2007

O Dividendo

Eu não preciso que o Jornal de Negócios me faça as contas, até porque aqui a política de dividendos deve ser diferente. Apenas quero perguntar ao CEO* André Carvalho quanto é que os associados vão receber do seguinte bolo:



My blog is worth $160,893.90.
How much is your blog worth?

*Chief Executive Officer

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ficção (?)

O médico, perante uma rapariga vítima de violação, informa-a que está grávida e...

- Os procedimentos para o aborto não são complicados, eu posso...
- Não!
- Não?! Quer continuar a gravidez?!
- Sim. Vai contra os meus princípios. Eu não sou assassina... É uma vida...
- Sim... é uma vida, mas é uma vida que vai querer fazer crescer?!
- Mas o doutor é a favor do assassinato?
- Regra geral, não, mas, em certos casos, sim. E este caso do feto é um deles. É complicado definir limites. É discutível se o idiota que a deixou nesse estado deveria ou não continuar a viver. No caso do feto, podemos discutir os trimestres, mas há, sem dúvida, uma enorme barreira limitadora: o nascimento. Pode ser uma barreira moral muito ténue mas faz toda a diferença.

Seguiu-se uma troca de ideias sobre os desígnios de Deus... em que a mulher acredita e o médico não...


Pessoalmente, e, apesar de estar inclinada a concordar com o médico, não me parece que este seja o tipo de aconselhamento desejável... Se a mulher não quer, à partida, se vai contra os seus princípios, e não há risco de vida, o aborto não deve ser encorajado pelo médico. O médico deve saber acompanhar a posição da mulher e não impor-lhe a sua posição. Seria esta uma maneira de deixar a mulher mais à vontade para escolher, libertando-a um pouco do peso do assassinato que teria na consciência?... Mesmo assim...

Resta contextualizar o diálogo ali em cima: adaptado de memória do episódio de ontem do Dr. House – que, para além de ser uma série, é sabido que a personagem não prima pela delicadeza das relações humanas... por isso não deve haver razão para alarme. Mas deixou-me a pensar...

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Memórias pós-revolucionárias

Quando se deu o 25 de Abril estava algures em Coimbra, vivia em Lisboa, mas o meu pai assustado com o aparecimento da droga nas escolas, enviou-me para o interior, por lá ainda existia alguma pureza de costumes.
Levei alguns anos a perdoar-lhe este afastamento do seio familiar.
Estive um ano na escola de Coimbra e rapidamente voltei para o meu ambiente familiar.
O ambiente revolucionário começou a surgir na minha vida já tardiamente, frequentava uma saudosa escola em Lisboa e os meus amigos eram de todos os quadrantes da extrema esquerda, da JCP, do PSD e do CDS. Imaginam a complicação de conviver com amigos de ideologias tão contraditórias? É que naquela altura passava-se muito rapidamente para insultos criativos do género: fascista! comunista! terrorista!
São, no entanto, dessa altura dois episódios marcantes para o meu alheamento da actividade política.
O primeiro passou-se nas eleições para a Associação de Estudantes da Escola.
A JCP pretendia ganhar as eleições para a Associação, e nessas eleições resolveu trazer música. Os intervalos eram uma autêntica festa. Contudo, muito estranhamente, a música que se ouvia não era música revolucionária. Era música de dança, música pop.
Num dos intervalos perguntei-lhes se podia trazer o Paul Simon, o meu ídolo da altura. Disseram-me que sim. E no dia seguinte lá venho eu com o 45 rotações do Simon, o American Tune. Entreguei-lhes o disco num dos intervalos e não é que no intervalo seguinte lá estava a voz de Mr. Simon? Imaginam o que eu senti na altura? Eu gostava tanto do Paul... Essa satisfação durou apenas alguns segundos. Não é que o Simon foi abruptamente substituído por uma pop qualquer? Depois de perguntar a razão de tal procedimento responderam-me: é pá sabes é que a malta pretende ganhar as eleições e o Paul Simon não nos faz ganhar votos... Eu deveria ter 15 anos, mais coisa menos coisa, mas nunca mais confiei, nem confiarei, em nenhum partido.

Continua

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Billie Holiday

O que diferencia Billie das outras cantoras?
Lady Blues é, acima de tudo, porta voz do sofrimento e da injustiça, preconceitos extraordinariamente vivos, à época, apesar da abolição da escravatura.
A sua voz é para além de tudo um símbolo.
Tenho uma certa dificuldade em escolher um tema, o seu repertório é rico em versões e originais, destacaria God Bless the Child, My Man, One For my baby, Good Morning Heartache, Don't Explain, Gloomy Sunday, God Bless the Child, Good Morning Heartache, Stormy Heather, Summertime, e perante tantos clássicos escolho um óbvio.



Strange Fruit é tão difícil de adjectivar...

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Filhos do cê dê ésse [Parte 1]

Fui um daqueles afortunados que teve a oportunidade única de poder aprender a ler as primeiras palavras nas instrutivas paredes de uma Lisboa pós-revolucionária. Ainda me lembro [como se fosse hoje] da imensa satisfação que senti quando consegui ler a primeira frase completa. Nesse inolvidável dia, ia a sair da escola pela mão da minha progenitora, e consegui ler em voz alta a seguinte inscrição pintada numa parede exterior da Basílica da Estrela: “O Povo libertou Arnaldo Matos e libertará todos os antifascistas presos”. Recordo que o meu pai pareceu algo surpreendido, mas a minha mãe ficou tão feliz que nos dias que se seguiram sempre que me iam buscar à escola, à saída, virava-me para a Basílica e não me cansava de repetir aquela ladainha. Alguns dias mais tarde, ao sair da escola, ia naquela parte do “ e libertará”, quando senti uma valente carolada. Compreendi de imediato que o meu progenitor considerava que já estava na hora de eu começar a aprender a ler outro tipo de preposições.

Dizem as más-línguas que naquela época não se aprendia nada nas escolas. Maior falsidade não pode existir. Posso garantir que quando saí da escola primária [para além do Avante] já sabia de cor todas as letras e músicas do Zeca, Ermelinda, Adriano, Sérgio, Branco, e companhia limitada. E sou uma testemunha viva que o sistema de ensino era tão exigente e revolucionário, que também aprendíamos precocemente a entoar todos os pregões revolucionários; a traduzir todas as siglas das inumeráveis forças políticas, sociais, sindicais, militares e paramilitares; e a associar a complexa iconologia existente na época às respectivas [des]organizações.

E estão redondamente enganados todos aqueles que ainda pensam que a exigência educacional que incorria sobre as crianças pós-revolucionárias se cingia exclusivamente a áreas como a literatura, música ou a pintura. Também nos foi facultada uma formação de excelência na área das ciências exactas. Por exemplo, éramos compelidos a dominar a ciência matemática precocemente, pois tudo o que se passava à nossa volta era decidido após uma breve votação de braço no ar. E mais! Com a inflação galopante que se fazia sentir, se queríamos continuar a lanchar todos os dias as deliciosas bolas de berlim com creme, quentinhas, que se vendiam na cantina da escola, acompanhadas de um refrescante e super-nutritivo Pirolito, tínhamos de conhecer bem os processos inflacionários para poder negociar com os nossos pais todos os tostões das nossas semanadas.

[continua…]

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quinta-feira, março 22, 2007

Dess nha terra

Hoje não há estória, nem histórias.
Hoje não há deambulações,
nem passeios,
viagens ou cheiros,
cores ou cidades.
Hoje apenas a palavra sôdade

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Música e Poesia

1 - Iggy Pop é, sem dúvida, um grande ídolo do Rock.
Também me inclino mais para a selecção do André, The Passenger. Contudo, nos oitentas, uma banda liderada por uma senhora, Siouxie and the Banshees, também a recriou de uma forma bastante interessante. Aliás, as versões foram marcantes na memória que guardo dos Siouxie, especialmente Dear Prudence e Strange Fruit.
2 - Maria João abre o primeiro festival de jazz de Gaia. Eu nem sempe gosto de Maria João, mas só pelo Cd "Covers" ficará num cantinho do meu coração. Ah, e já ou_viram Maria João e Gilberto Gil falando com Deus?
3 - tantos são os poemas, tantos, e o desconcerto do mundo?
Os bons vi sempre passar
No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.
Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só pera mim,
Anda o Mundo concertado.

Ao desconcerto do Mundo, Luís de Camões

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quarta-feira, março 21, 2007

Só faltou o sono, a água e a discriminação...

Como aqui atrás se disse, hoje celebra-se muita coisa. Numa tentativa de fazer um post dedicado ao máximo de causas que hoje se celebram, e tendo em conta que entramos na recta final da Festa da Música do GR, o melhor que consegui foi misturar floresta com poesia com árvores e com música:

Canção
Silfos ou gnomos tocam?
Roçam nos pinheirais
Sombras e bafos leves
de ritmos musicais.
Ondulam como em voltas
De estradas não sei onde
ou como alguém que entre árvores
Ora se mostra ou esconde.
Forma longínqua e incerta
Do que eu nunca terei
Mal oiço e quase choro
Porque choro não sei
Tão ténue melodia
Que mal sei se ele existe
Ou se é só o crepúsculo,
Os pinhais e eu estar triste.
Mas cessa, como uma brisa
Esquece a forma aos seus ais.
E agora não há mais música
Do que a dos pinheirais.


[Este poema de Fernando Pessoa foi cantado por António Variações. Não consegui um link ou vídeo para o mesmo.]

Edit (com um obrigado à Cristina): podem ouvir trinta segundos da «Canção» em «www.variacoes.com [a "Canção" em causa é a 6 do CD2 e somos contemplados com 30 segundos do refrão]»

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Jogo de Palavras

Na poesia o jogo que se faz com a palavra é mais importante do que o seu significado. É claro que a poesia não é só forma, mas a forma como está distribuída a palavra é que lhe concede maior ou menor importância no poema. Deixo-vos um exemplo de uma letra, que para mim é um excelente poema, em que a dança constante das mesmas palavras nos conduz a um significado completamente diferente do que no início do mesmo se previa.


Nick Cave - The Mercy Seat

It began when they come took me from my home
And put me in Dead Row,
Of which I am nearly wholly innocent, you know.
And I'll say it again
I..am..not..afraid..to..die.
I began to warm and chill
To objects and their fields,
A ragged cup, a twisted mop
The face of Jesus in my soup
Those sinister dinner meals
The meal trolley's wicked wheels
A hooked bone rising from my food
All things either good or ungood.

And the mercy seat is waiting
And I think my head is burning
And in a way I'm yearning
To be done with all this measuring of truth.
An eye for an eye
A tooth for a tooth
And anyway I told the truth
And I'm not afraid to die.

Interpret signs and catalogue
A blackened tooth, a scarlet fog.
The walls are bad. Black. Bottom kind.
They are sick breath at my hind
They are sick breath at my hind
They are sick breath at my hind
They are sick breath gathering at my hind

I hear stories from the chamber
How Christ was born into a manger
And like some ragged stranger
Died upon the cross
And might I say it seems so fitting in its way
He was a carpenter by trade
Or at least that's what I'm told
Like my good hand I
Tatooed E.V.I.L. across it's brother's fist
That filthy five!
They did nothing to challenge or resist.

In Heaven His throne is made of gold
The ark of his Testament is stowed
A throne from which I'm told
All history does unfold.
Down here it's made of wood and wire
And my body is on fire
And God is never far away.
Into the mercy seat I climb
My head is shaved, my head is wired
And like a moth that tries
To enter the bright eye
I go shuffling out of life
Just to hide in death awhile
And anyway I never lied.

My kill-hand is called E.V.I.L.
Wears a wedding band that's G.O.O.D.
`Tis a long-suffering shackle
Collaring all that rebel blood.

And the mercy seat is waiting
And I think my head is burning
And in a way I'm yearning
To be done with all this measuring of truth.
An eye for an eye
And a tooth for a tooth
And anyway I told the truth
And I'm not afraid to die.
And the mercy seat is burning
And I think my head is glowing
And in a way I'm hoping
To be done with all this weighing up of truth.
An eye for an eye
And a tooth for a tooth
And I've got nothing left to lose
And I'm not afraid to die.
And the mercy seat is glowing
And I think my head is smoking
And in a way I'm hoping
To be done with all this looks of disbelief.
An eye for an eye

And a tooth for a tooth
And anyway there was no proof
Nor a motive why.
And the mercy seat is smoking
And I think my head is melting
And in a way I'm helping
To be done with all this twisted of the truth.
A lie for a lie
And a truth for a truth
And I've got nothing left to lose
And I'm not afraid to die.
And the mercy seat is melting
And I think my blood is boiling
And in a way I'm spoiling
All the fun with all this truth and consequence.
An eye for an eye
And a truth for a truth
And anyway I told the truth
And I'm not afraid to die.
And the mercy seat is waiting
And I think my head is burning
And in a way I'm yearning
To be done with all this measuring of proof.
A life for a life

And a truth for a truth
And anyway there was no proof
But I'm not afraid to tell a lie.
And the mercy seat is waiting
And I think my head is burning
And in a way I'm yearning
To be done with all this measuring of truth.
An eye for an eye
And a truth for a truth
And anyway I told the truth
But I'm afraid I told a lie.

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Em tons de azul

Esta sugestão do RAF é excelente, mas quando se fala de Iggy Pop a memória remete--me de imediato para outro clássico.

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Divas: Annie Lennox



"Why"

How many times do I have to try to tell you
That I'm sorry for the things I've done
But when I start to try to tell you
That's when you have to tell me
Hey... this kind of trouble's only just begun
I tell myself too many times
Why don't you ever learn to keep your big mouth shut
That's why it hurts so bad to hear the words
That keep on falling from your mouth
Falling from your mouth
Falling from your mouth
Tell me...
Why
Why

I may be mad
I may be blind
I may be viciously unkind
But I can still read what you're thinking
And I've heard is said too many times
That you'd be better off
Besides...
Why can't you see this boat is sinking
(this boat is sinking this boat is sinking)
Let's go down to the water's edge
And we can cast away those doubts
Some things are better left unsaid
But they still turn me inside out
Turning inside out turning inside out
Tell me...
Why
Tell me...
Why

This is the book I never read
These are the words I never said
This is the path I'll never tread
These are the dreams I'll dream instead
This is the joy that's seldom spread
These are the tears...
The tears we shed
This is the fear
This is the dread
These are the contents of my head
And these are the years that we have spent
And this is what they represent
And this is how I feel
Do you know how I feel ?
You don't know what I feel

Annie Lennox

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Princípios

Podíamos saber um pouco mais
da morte. Mas não seria isso que nos faria
ter vontade de morrer mais
depressa.

Podíamos saber um pouco mais
da vida. Talvez não precisássemos de viver
tanto, quando só o que é preciso é saber
que temos de viver.

Podíamos saber um pouco mais
do amor. Mas não seria isso que nos faria deixar
de amar ao saber exactamente o que é o amor, ou
amar mais ainda ao descobrir que, mesmo assim, nada
sabemos do amor.
Nuno Júdice

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Alguns séculos depois

Poema da auto-estrada

Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta.
Vai na brasa, de lambreta.

Leva calções de pirata,
vermelho de alizarina,
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de idantreno,
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa de lambreta.

Agarrada ao companheiro
na volúpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita fingido,
que o receio não é com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.

Como um rasgão na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que se enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.

Na confusão dos sentidos
já nem percebe, Leonor
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.

Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa de lambreta.

António Gedeão


Depois da Lianor a Leonoreta.

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Dia Mundial do Sono

[...]
Como no poço da morte
como no poço da morte
a gente gira contra ventos e marés
e tempestades e tornados
como os miúdos teimam
em ficar acordados
e lutam contra o sono
com os olhos arregalados
assim nós também p’ra lá da fadiga
giramos acordamos e dizemos:
eu tenho a morte toda p’ra dormir

Mas como se costuma dizer
tem que ser
porque parar, nunca
Ficar parado?
Antes o poço da morte
que tal a sorte
[…]

Sérgio Godinho, “Antes o poço da morte” (1980)


Hoje é, de facto, Dia de muita coisa. Para além da poesia e da árvore/floresta e também da luta contra a discriminação racial, hoje é Dia Mundial do Sono!!! Sendo, talvez, o menos significativo de todos eles, acredito que será o que menor destaque merecerá por aí. Mas, como dormir é um dos meus pequenos prazeres da vida - cada vez mais negligenciado -, não pude deixar de fazer referência. E, já que estamos no Dia dele, confesso:

Sérgio, amigo, acho que tenho seguido este teu texto demasiado à letra...

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Bauhaus


A minha preferida é de longe "All We Ever Wanted is Everything", mas como no YouTube a audível é "She's in Parties" trago-vos esta, também outra das eleitas.
A música é uma das minhas paixões, mas, para mim, os momentos mais fascinantes são sem dúvida quando cozinho e ligo leitor de Cd's e, muito raramente, a assistir a um concerto.
Se calhar faz-me falta aquele cruzar de odores, parece que há uma certa relação criativa entre uma actividade e outra.

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há dias assim


Hoje é dia de muita coisa e de coisas está repleto o mundo...
Dia da árvore, começa hoje a Primavera e é, sem dúvida nenhuma, a minha estação preferida.
Dia da água, um bem essencial à vida e tão menosprezado, por vezes, pelo homem.
Dia Mundial da Poesia, pelos vistos em Santo Tirso alguns poetas encarceraram-se em conventos e o seu "desencarceramento" é realizado através de um cortejo e de alguém que diz um poema.
Estranha forma de comemorar a poesia, penso eu.
Preconceito, dirá o digníssimo leitor, talvez.
Gosto pouco de conventos e mosteiros, apesar de ser capaz de lhes apreciar a arquitectura.
Há até um transformado em Pousada pelo Arqto Souto Mouro uma reconversão digna de nós e do nosso repouso.
Aqui no "GR" comemoramos a poesia de outra maneira.
Oferecendo, ao caríssimo leitor, poesia.
Hoje, nesta esfera, passo então a palavra.
E a quem?
Há imensa poesia portuguesa excelente, canónica e há até quem chegue rapidamente ao século XVI e dali não saia.

Descalça vai para a fonte

Descalça vai para a fonte
Lianor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.

Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata,
Sainho de chamelote;
Traz a vasquinha de cote,
Mais branca que a neve pura.
Vai fermosa e não segura.

Descobre a touca a garganta,
Cabelos de ouro entrançado
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta.
Chove nela graça tanta,
Que dá graça à fermosura.
Vai fermosa e não segura.

Luís de Camões

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terça-feira, março 20, 2007

The Closest Thing to Crazy

Há dias em que nos sentimos derrotados. Sentimos isso naqueles dias em que a vida corre depressa demais para a nossa breve passada. Apercebemo-nos que não há muito mais a fazer do que ficar sentado a olhar a voragem das rotinas a fazer o trabalho de nos tornar velhos. As palavras, como disse o poeta, estão gastas mas, nesses dias, sentimos que, para além das palavras, também os gestos, as emoções, as vontades, os sonhos estão acabados e achamo-nos sem coragem para nos levantar. Nesses dias, estamos mais distantes de nós mesmos; nesses dias, somos uma renúncia da nossa origem; nesses dias, encontramo-nos mais perto da loucura. A mudança ocorre estimulada por um acontecimento feliz, por um reencontro há muito aguardado, por um conselho amigo ou então, e muito simplesmente, a mudança dá-se quando escutamos alguém a declarar, mostrando que nos compreende, numa voz serena sobre um piano, aquilo que lhe fez estar mais próximo da loucura.

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antecipando o Dia de amanhã...

Nome inspirado – digo eu! – na exposição patente na Reitoria da U.P. até ao mês de Junho: Depósito: anotações sobre densidade e conhecimento – ainda não fui ver... Mas hoje pelas 18h, o “Depósito” significa poesia nas imediações da Praça Gomes Teixeira (vulgo, Leões). No “Piolho” – o café dos estudantes – e na Lello – a livraria emblemática da cidade – iniciam-se percursos poéticos que terminam no 4º piso do edifício da Reitoria com uma ligação algures a Lisboa ao som de Kika Santos.

Apresenta assim Rui Reininho (autor do conceito, director e um dos diseurs): Poetas com vidas duplas, triplas, tísicos, nomes de Ruas laureados ou injustamente esquecidos, serão ditos e dramatizados numa singela e ruidosa homenagem desde o século XVI até ao que resta dos nossos dias.

Fica, então, o convite - a quem ande pelo Porto - para um fim de tarde diferente, antecipando o Dia de amanhã...

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O dia do pai


Ontem foi dia do pai.
A figura do pai é tão importante no nosso Universo pessoal como a da mãe.
Lembro-me de imensa coisa que o meu pai me ensinou:
- a dançar, era um dançarino de excelência, não falhávamos nenhum bailarico de aldeia quando estávamos de férias;
- a nadar, ainda o pouco que sei foi com ele que aprendi;
- a conviver e estimar os amigos, apesar de a vida de hoje em dia ser um pouco avessa ao convívio;
- a viver a vida com alegria e dar pouca importância ao dinheiro, se se tem, tem-se, se não se tem, não se tem.
O meu pai foi um pai e pêras!
Michael Dudok de Wit realizou um pequeno filme, cerca de 8', "Father and Daughther", que ilustra de uma forma dramática a importância desta relação.

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segunda-feira, março 19, 2007

Constatação

Os acólitos de Portas e de Ribeiro e Castro envolvem-se em insultos, o PSD teve quatro personalidades neste fim-de-semana (só aqueles que me lembro de cabeça) que foram indiciados para candidato a líder. O PCP continua a ser aquilo que era há 30 anos e o BE continua a não se saber muito bem o que é. Perante este cenário, ao PS basta continuar a ser a coisa mais parecida com um partido para ganhar as legislativas de 2009.
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One from the heart


Já não me lembro do ano, o local era o Apolo 70, apenas porque era o cinema mais próximo do meu autocarro.
Vi por lá alguns excelentes filmes, One from the heart foi um deles.
Diz a lenda que Coppola ficou arruinado à conta desta obra construída com instrumentos cirúrgicos.
O cenário todo recriado em estúdio tem uma tonalidade artificial mas quente, emocionalmente forte, muito forte.
Estas são as minhas memórias de "Do fundo do coração" de Coppola.
Não as ouso desmentir.
Tenho tanto respeito por elas que raramente me atrevo a rever um filme.
A banda sonora ficou a cargo de um "clássico" americano.
Directamente dos Zoetrop Studios Mr. Tom, Tom Waits aqui ainda com uma voz audível.

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A Gente Não Lê (Isabel Silvestre)



A [versão] da Isabel Silvestre é o "top" [das versões sobre a dupla Tê/Veloso] e "a gente não lê" ganha uma dimensão extraordinariamente verosímil.

Tão verosímil, tão verosímil, que eu, na altura, nem sabia que era uma versão! Lembro-me de acordar vezes sem conta com esta música a passar nas manhãs da Antena1. Era daquelas alturas em a falta de imaginação das escolhas musicais radiofónicas não me incomodava nem um bocadinho! Só muito mais tarde ouvi isto cantado por Rui Veloso... Foi tão estranho... Mas porque é que havia ele de "estragar" a canção da Isabel?! Pois... Só mais tarde ainda é que percebi que, de facto, a canção é dele (1982)... Uma vénia ao senhor Tê pela letra e ao senhor Veloso pela música, mas o prémio de interpretação vai inteirinho para a senhora Isabel Silvestre.

De resto, confesso que conheço pouco da senhora. Obviamente, a participação na "Pronúncia do Norte" dos GNR e... a interpretação do hino do Porto a capella na abertura do Dragão ;) Para além disso, ouvi-a em duas ou três entrevistas e fica-me a admiração pelo esforço real de revitalização das tradições e pela autenticidade que imprime em tudo o que faz.

A Gente Não Lê
Isabel Silvestre
álbum: A Portuguesa (1997)
letra/música: Carlos Tê / Rui Veloso

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O Hino

Numa das últimas edições do NME (New Musical Express), era apresentado da seguinte forma: quarenta anos, continua a fazer os outros milionários, morto. Falava-se da celebração do quadragésimo aniversário de Kurt Cobain. Mais do que esses artifícios, que não passam de constatações do óbvio com uma leitura moralista digna dos tablóides, importa esclarecer o seguinte: os Nirvana foram, desde há muito, a única banda que concretizou o presságio de «the next big thing» Eram uma banda, mas acima de tudo era Kurt, um exímio escritor de canções, deprimido, com uma rara capacidade musical. As canções eram escritas com uma simplicidade desarmante: três ou quatro acordes sobre uns versos repetidos até à exaustão. Uns arranjos ora despidos na crueza do acústico, ora vestidos com distorção. E nisto da arte, principalmente da arte pop/rock, simplicidade quer quase sempre dizer génio: a crítica rendeu-se, o público, idem. O que, convenhamos, é raro. O sucesso imenso da banda apanhou um Kurt demasiadamente adicto e desprevenido para lidar com ele. O resto é história. E é história, principalmente, o legado musical que nos deixou. Fiquem então com uma excelente cover de Bowie (The man who sold the world), e aquele que, sem grande margem de erro, será lembrado como o hino da "geração rasca" (não do blogue, obviamente): Smells Like Teen Spirit.

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domingo, março 18, 2007

Prognósticos só depois do jogo

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Post Camiliano

Numa recente visita à Casa-Museu de Camilo Castelo Branco, em S. Miguel de Ceide, informou-me a guia que no exemplar de «A Relíquia» de Eça de Queiroz que existe na biblioteca da casa, lê-se como anotação final que «este livro divide-se em duas distintas partes: a primeira é entediante, a segunda é maçadora e de um completo mau gosto». Pensando depois no assunto, lembrei-me de uma boa dezena de aspectos da sociedade portuguesa a que este juízo assentaria que nem uma luva. Mesmo não concordando com ele quando aplicado à «Relíquia» queiroziana.

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Porto versus Lisboa


No derby de ontem saiu o Sul vitorioso, mas nem sempre é assim.
Musicalmente o derby também é renhido e do Norte surgem:
o fortíssimo "song book" da dupla Veloso/Tê, mas igualmente importante tanto histórica como musicalmente o de Sérgio Godinho e dos GNR, destacaria ainda os Três Tristes Tigres, Clã, Old Jerusalem (um rapazinho q faz lembrar James Taylor).



No Sul a concorrência também não é de se ignorar:
Madredeus, Jorge Palma, Xutos e Pontapés, e mais recentemente Ala dos Namorados, Humanos, Gaiteiros de Lisboa, João Afonso, Filarmónica do Gil, Sara Tavares, Camané, Mariza, Cristina Branco, sendo a lista de novos fadistas interminável.

Não falo nos falecidos, pois aí António Variações, José Afonso e Amália seriam difíceis de ultrapassar...

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